Uma novela original WNC
Autora: Megan Clarke
Capítulo 20
“Destilando
o Veneno”
CENA 1/ HOSPITAL/
UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA/ INTERIOR/ NOITE.
Close num recipiente plástico pequeno, na qual caem gotas de um líquido
incolor, que aparenta ser soro.
Som de máquina de batimentos cardíacos ao fundo.
Close na máquina e nos batimentos sendo registrados na mesma.
Close novamente nas gotas que caem no recipiente plástico. / Close no
líquido que percorre o interior de um tubo.
Foco no rosto do gêmeo que sobreviveu a explosão da lancha. Ele está
desacordado e entubado na cama, com curativos no rosto e nos braços. –
Chamaremos ele de “G2” a partir de agora.
Close em Nicole que observa do lado de fora através de um vidro,
abalada. Ela chora silenciosamente.
Som das máquinas sempre presente na cena.
CENA 2/ SALA DE ESPERA/ INTERIOR/ NOITE.
Nicole vêm do corredor da UTI, cabisbaixa.
Ravena chega ao local desesperada, acompanhada de Miguel, Olívia e
Bruna.
Ela vai diretamente até Nicole.
RAVENA: Meu filho. Cadê meu filho?
NICOLE: Ele tá na UTI... – (T) - Os médicos disseram que ele perfurou o
baço...
BRUNA: (chora) Meu Deus...
NICOLE: (cont.) Passou por uma cirurgia, mas apesar de ter saído dela
numa boa, o caso ainda é delicado.
OLÍVIA: (chora) Não me conformo com isso.
NICOLE: Eu tentei ligar pra vocês hoje de tarde, mas só dava caixa
postal.
OLÍVIA: Tem vezes que o sinal nessa cidade consegue ser mais horrível do
que ela mesma.
BRUNA: (pensativa) Eu tava sentindo que tinha alguma coisa errada, eu
avisei ao Samuca, disse pra ele não ir pra esse passeio.
MIGUEL: (para Nicole) A polícia, o que disse?
NICOLE: Vão continuar as buscas pelo outro que sumiu.
BRUNA: (marejando) Mas qual dos dois sobreviveu?
NICOLE: Eu não sei.
BRUNA: Como assim você não sabe?
NICOLE: Eu não sei, simplesmente não sei.
Ravena se aproxima dela.
RAVENA: Nicole... A pinta que um dos dois tem... Os médicos falaram
alguma coisa? Eles viram se ele tinha uma pinta?
MIGUEL: (se irrita) Você acha que médico vai ficar reparando se o garoto
tem pinta ou se não tem, mulher?
NICOLE: Eu tava tão atordoada que nem pensei nisso.
RAVENA: (chora/desesperada) Meu Deus do céu...
BRUNA: Se a gente conferir isso, vamos ter certeza de qual dos dois
sobreviveu a essa explosão.
NICOLE: Mas acho que vai ser difícil, pelo menos agora... Ele tá
desacordado, o caso é delicado... Por enquanto o que a gente tem que fazer é
rezar pra que encontrem o outro corpo ou até mesmo que ele esteja vivo.
Todos aflitos. Close.
CENA 3/ UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA/ INTERIOR/ NOITE.
Som das máquinas de batimentos cardíacos e oxigênio.
Câmera vai dando close em G2 desacordado.
Close em seu olho esquerdo: sua pálpebra vai se mexendo aos poucos.
Close em seus dedos que também vão se mexendo aos poucos.
Close agora em seus olhos que se abrem abruptamente. Fade out.
CENA 4/ APART-HOTEL DE MÁRIO/ INTERIOR/ TARDE.
Fade in. Getúlio de pé assina os papéis com o advogado ali presente. Em
seguida, ele entrega a caneta para que Nicole também assine e assim, ela o faz.
Mário, mais afastado, presencia toda a cena em silêncio.
Getúlio entrega os documentos ao advogado que analisa.
ADVOGADO: Pronto. – (sorri) - Tudo certo!
NICOLE: Bom, agora eu sou dona da empresa e tudo o que te pertence,
certo?
GETÚLIO: Como você mesma desejou.
NICOLE: Ótimo!
GETÚLIO: Agora, bico calado e me deixe em paz, ouviu?
NICOLE: Claro. Acha que eu vou vir te visitar todos os dias, te trazer
docinhos ou coisas assim? Eu quero mais é que você se foda!
Getúlio sorri pra ela.
GETÚLIO: Que coisa mais linda. Educada como a mãe, igualzinha a ela
quando tinha a sua idade. – (aperta a bochecha dela com força e desfaz o
sorriso) – Um doce de menina. (para Mário) Você, leve essa garota pra casa
dela.
MÁRIO: Eu já imaginava. Não sirvo pra mais nada nessa merda além de
motorista particular dos outros.
GETÚLIO: Ainda bem que você sabe que não serve pra nada. Agora vai!
MÁRIO: (para Nicole) Vamos!
Nicole encara Getúlio e em seguida sai dali, seguida de Mário.
Getúlio se volta para o advogado.
GETÚLIO: Você fez um excelente trabalho.
ADVOGADO: Imagina, senhor.
GETÚLIO: Ah, quê isso?! Não vai fazer o modesto agora né? Você é um
homem competentíssimo, um excelente profissional.
Getúlio caminha até uma mesa com várias garrafas de uísques e alguns
copos.
ADVOGADO: Eu agradeço os elogios, senhor.
Getúlio põe uísques em dois copos e sem o advogado ver, ele retira um
frasco do bolso da camisa e despeja o conteúdo em um dos copos.
Close no advogado distraído, olhando o apartamento.
Getúlio vai até ele, segurando os dois copos com uísque e lhe entrega um
dos.
GETÚLIO: Vamos brindar a mais um excelente serviço prestado.
ADVOGADO: (pegando o copo) Obrigado!
Os dois brindam. O advogado bebe o uísque e Getúlio fica a observar. Em
seguida, ele também toma um gole da bebida.
GETÚLIO: Sabe? Você vai ganhar muito bem por seu trabalho. Porque nunca
nessa vida eu encontrei pessoa mais competente, mais presente, mais prestativa
do que você. – (T) – Bom, infelizmente tenho que dizer que seu serviço acaba
aqui.
ADVOGADO: O Senhor não vai mais precisar dos meus serviços?
GETÚLIO: (pensativo) Creio que não. – (o encara) – Mas eu deixei um
presente pra você.
ADVOGADO: (sem entender) Deixou?
GETÚLIO: Deixei... uma passagem!
ADVOGADO: Passagem... Seria uma passagem pra Paris?
GETÚLIO: Não... digamos que Paris é um lugar muito frio perto desse
lugar pra onde você vai. (T) Eu te dei uma passagem, mas foi pro inferno!
O advogado ri.
ADVOGADO: Eu não entendi o que o sr. quis dizer.
Getúlio não responde, apenas o observa. O advogado começa a tossir,
afrouxando a gravata. Ele então solta o copo e começa a mostrar sinais de
tontura. Getúlio o observa friamente.
ADVOGADO: (voz rouca) O que você fez?...
GETÚLIO: Eu disse que você é um excelente profissional... disse que você
era competente... mas não disse que era de confiança.
O advogado o olha com os olhos vermelhos e tentando respirar, sem
sucesso.
GETÚLIO: No momento mais oportuno você iria me delatar pra polícia...
sei que iria. – (T) – Desculpa. (sorri) Não é nada pessoal.
Ele se afasta e pega um smartphone que está ali perto. O velho conecta
fones de ouvido no aparelho e em seguida, dá play em “Shape of You –
Ed Sheeran”.
O advogado se segura no sofá e vai agonizando, aos poucos. Seu rosto
está vermelho e suas veias do pescoço alteradas. Ele, com os olhos arregalados
vai cada vez se sentindo pior, como se o veneno estivesse lhe comendo por
dentro.
Close em Getúlio que com os olhos fechados, dança levemente ao som da
música que permeia a cena.
Foco no advogado agonizando no chão.
Fade out.
Trilha off.
CENA 5/ MANSÃO DOS CAVALCANTI/ SALA DE ESTAR/ INTERIOR/ TARDE.
Cristina está no sofá vendo desenho animado na televisão. Ela está
cabisbaixa, sem prestar atenção no desenho.
Palmira vem da cozinha trazendo uma bandeja com uma fatia de bolo e um
copo de suco e põe na mesa de centro da sala.
PALMIRA: Trouxe pra você.
CRISTINA: Não quero.
PALMIRA: Ué, por que não? Achei que gostasse do meu bolo.
CRISTINA: Tô sem vontade de comer.
PALMIRA: Mas precisa comer. Você tá em fase de crescimento.
CRISTINA: (marejando) Tô com saudade do Samuca e do Alex.
Ela começa a chorar.
CRISTINA: (chorando) Leva isso daqui. Eu não quero comer nada.
Palmira vai até ela, abraçando-a.
PALMIRA: Não fica assim não. Eles vão voltar! Tem que ter esperança,
pensamento positivo. Tem que ter fé! – (T) – Um deles já tá no hospital, os
médicos estão cuidando dele. Vai ficar tudo bem!
Bruna aparece de repente na sala. Palmira solta-se de Cris e vai até
ela.
PALMIRA: Alguma notícia?
BRUNA: Acabei de ligar pro policial que está liderando as buscas, mas
até agora nada.
Palmira respira fundo.
PALMIRA: Eu vou pra cozinha adiantar as coisas pro jantar. Faz um pouco
de companhia a ela.
Palmira vai pra cozinha. Bruna respira fundo e Cristina continua
pensativa, com os olhos molhados de lágrimas.
CENA 6/ HOSPITAL/ UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA/ INTERIOR/ TARDE.
Ravena conversa com o médico enquanto G2 está dormindo.
DOUTOR: Ele acordou do coma, mas ainda teremos que mantê-lo em
observação aqui por mais alguns dias.
RAVENA: Ele vai ficar com alguma sequela doutor?
DOUTOR: Tentei conversar um pouco com ele, mas...
RAVENA: Mas o quê?
DOUTOR: Ele falou que não se lembra de absolutamente nada. Acordou
perguntando onde estava e quem ele era.
Ravena fica aflita.
RAVENA: Ai, meu Deus.
DOUTOR: É uma amnésia, provavelmente causada pelo impacto do acidente.
Mas estranhei, pois, nos exames não havia resultado algum de traumas cerebrais.
RAVENA: Tomara que seja algo passageiro. – (T) – Mas doutor, eu queria
saber do senhor se viu alguma pinta nele.
DOUTOR: Pinta?
RAVENA: Sim, um sinal de nascença. Ele tem um irmão gêmeo, não sei se
ficou sabendo...
DOUTOR: Evidente...
RAVENA: Bom, essa pinta fica um pouco abaixo do abdômen e apenas um
deles a têm. No caso, é o meu filho Alex. O senhor não viu se esse aqui tem
ela?
DOUTOR: Espera um pouco.
O médico vai caminhando até o paciente e em seguida, discretamente,
levanta seu cobertor e em seguida, seu roupão. Detalhar um curativo na parte de
baixo do abdômen dele.
O médico vai até Ravena.
DOUTOR: Está coberta por um curativo.
RAVENA: (atordoada) E agora? Será que um exame de DNA não poderia
resolver isso?
DOUTOR: É impossível. Você disse que os dois são gêmeos idênticos...
Pois é. Gêmeos univitelinos possuem o mesmo tipo sanguíneo e o mesmo DNA. Não é
assim tão simples.
RAVENA: Agora vou ficar sem saber quais dos meus dois filhos sobreviveu,
é isso?
DOUTOR: Até que o próprio recupere sua memória e diga quem é... – (vai
saindo) – Bom, qualquer coisa, a enfermeira que está de plantão irá ajudar. Com
licença.
O médico sai do local. Ravena fica pensativa. Close em G2, dormindo.
CENA 7/ ANOITECE/ MANSÃO DOS PRATES/ SALA/ INTERIOR/ NOITE.
Eduardo entra na mansão e vai caminhando em direção as escadas, mas para
quando vê Alexandra descendo.
Ele então se afasta e já começa a ficar impaciente.
ALEXANDRA: Ah, o filho pródigo voltou... aliás: o neto pródigo. Posso
saber aonde você estava?
EDUARDO: (indignado) Como é que você teve a coragem de demitir o Gui?
ALEXANDRA: E desde quando precisa de coragem pra fazer uma coisa tão
simples como essa? – (T) – Aquele morto de fome passou por cima de uma ordem
minha... eu o demiti por justa causa.
EDUARDO: Injusta causa! Demitir alguém por causa da sexualidade não é
uma justificativa... é desumanidade!
ALEXANDRA: (rindo) Não me diga! Vai dizer o quê agora, Eduardo? Que
vocês dois estão juntos?!...
EDUARDO: E se eu disser que sim, você vai me expulsar dessa casa também?
Alexandra desfaz o sorriso e fica séria.
ALEXANDRA: (desacreditada) Você passou a noite com ele?
EDUARDO: Pra você ver que nem a sua falta de caráter impediu que nós
dois parássemos de continuar aquilo que a gente tinha começado.
ALEXANDRA: (se descontrola) Eu não acredito que você passou a noite com
aquele cachorro sarnento.
EDUARDO: (grita) Para de ofender o Guilherme! – (T) - Para agora!
ALEXANDRA: Você tá me dando uma ordem?
Eduardo respira fundo e põe a mão na cabeça, tentando controlar a raiva
que está sentindo.
ALEXANDRA: Quem você pensa que é pra me dar ordens, seu moleque? Tá
achando que é alguém? Olha que a sua mãe era assim hein?! E você sabe muito bem
como foi que essa história terminou...
Eduardo a encara.
EDUARDO: Não mete a minha mãe nessa história, Alexandra!
ALEXANDRA: (provoca) Aí ó, igualzinho a ela. Mesmo jeito petulante, mesma
ousadia... E ainda quer cometer a mesma burrice que a sua mãe, que preferiu
fugir de casa com você a ter que se casar com o seu pai.
EDUARDO: Para...
ALEXANDRA: Pra completar, me deixou você como herança. Uma criança chata
que nunca calava a boca, chorando com falta da mãe. Um garoto que nunca prestou
pra nada e só me trouxe problemas. Você devia ter morrido nos destroços daquele
carro junto com a imbecil da sua mãe...
EDUARDO: (dá um tapão na cara dela) PARA! – (T) – PARA! – (T) – LAVA
ESSA BOCA IMUNDA PRA FALAR DA MINHA MÃE! Sua desgraçada!
Alexandra chocada com a mão no rosto.
ALEXANDRA: Como você tem coragem de bater em mim?
EDUARDO: (a pega pelos ombros) Você já foi longe demais! Você comprou
briga com a pessoa errada, Alexandra!
Eduardo sobe as escadas. Alexandra fica pensativa.
ALEXANDRA: Quem comprou briga com a pessoa foi você, querido!...
Close nela.
CENA 8/ BAR/ INTERIOR/ NOITE.
Olívia entra no bar e senta-se numa mesa. O garçom vai atende-la. Ela
fala com ele em off.
CORTA PARA o garçom enchendo o copo dela com cerveja e depois, colocando
a garrafa em cima da mesa.
OLÍVIA: (sorri fracamente pra ele) Obrigada!
Ela fica a olhar para o copo cheio, pensativa. Close.
CENA 9/ APART-HOTEL DE MÁRIO/ INTERIOR/ NOITE.
Mário entra no apartamento. Getúlio de pé, esperando por ele.
GETÚLIO: Demorou hein...
MÁRIO: (vê o corpo do advogado no chão) O que você fez?
GETÚLIO: O que você acha?
MÁRIO: Ele morreu?
GETÚLIO: (irônico) Não... ele se deitou aí pra tirar um cochilo.
MÁRIO: (impaciente) Ah, Getúlio...
GETÚLIO: Ah uma porra. Quero que você pegue aquela caixa que tá ali e
suma com o corpo desse infeliz.
MÁRIO: Se você pensa que eu vou servir de capacho pra você pelo resto da
vida, tá muito enganado!
GETÚLIO: (direto) Se livra do corpo desse homem! A gente discute sobre
direitos trabalhistas numa outra hora.
Ele sai dali, caminhando em direção ao lavabo.
CENA 10/ ESTRADA DESERTA/ EXTERIOR/ NOITE.
Uma caminhonete percorre uma estrada deserta e com iluminação precária.
CENA 10A/ MATA/ INTERIOR/ NOITE.
A caminhonete adentra a mata e em seguida, Mário sai da mesma.
Cortes descontínuos:
- Ele retira a caixa de dentro do veículo, atirando-a no chão.
- Ele despeja gasolina por toda a caixa e em seguida, ateia fogo na
mesma.
Mário sorri ao ver a caixa pegando fogo. Close nele.
Ouve-se um som de miado.
Trilha Sonora: Natural – Imagine Dragons.
Mário olha pra trás e vê um gato. Ele sorri aos poucos e chama o animal,
em off. O felino caminha até ele e em seguida, Mário o pega no colo.
Câmera se afasta aos poucos e foca na caixa em chamas.
Trilha off.
CENA 11/ APART-HOTEL DE MÁRIO/ INTERIOR/ NOITE.
Mário entra no local com o gato nos braços e em seguida põe o animal no
chão.
GETÚLIO: Que gato é esse?
MÁRIO: Achei perdido na mata e resolvi trazer comigo... deve estar
faminto.
GETÚLIO: Ficou louco? Esse bicho vai feder esse apartamento todo.
MÁRIO: Apartamento que por sinal me pertence/
GETÚLIO: (corta) E que você comprou com o meu dinheiro! E por falar
nisso, eu preciso tratar com você desse assunto. (T) Essa garota veio aqui
tirar tudo o que é meu... E conseguiu... (T) Mas você... cê vai recuperar tudo
pra mim!
MÁRIO: Como assim... o que você quer dizer com isso?
GETÚLIO: Você vai dar um jeito de se casar com essa garota em comunhão
total de bens. – (T) – E assim que vocês dois estiverem juntos lá, na lua de
mel... você vai matar ela!
Trilha Sonora: Believer – Imagine Dragons.
Getúlio encara Mário que o olha, atento.
GETÚLIO: Você vai terminar o serviço que eu não consegui completar lá
atrás... Você vai matar essa menina e vai passar esse dinheiro pro meu nome!
Close em Mário. Fade out.
Postar um comentário