Humilhação, beleza e força


Ele estava ali, me observando diante de toda a humilhação. Acho bastante simbólica essa observação, até porque, entre ele e Christine, o George era a pessoa que mais poderia me compreender. Era ele quem sempre me observava como filho, apesar de nunca ter chegado a me apoiar de fato. Eu sentia que ele tinha vontade, mas infelizmente vivia nas asas daquela mulher lá. Espero que isso tenha mudado, porque neste momento ele vêm caminhando até a mim com uma expressão indecifrável.

Eu sentia receio. Receio por todas as possibilidades do que poderia acontecer, mas ele simples segurou no meu braço com leveza e fez um gesto com a cabeça para que eu o acompanhasse. Eu fui, sem pestanejar. Se ele fosse me humilhar, pelo menos não seria na frente de todo mundo.

Ele me levou até uma das lojas. Era tudo muito luxuoso, tudo muito iluminado. Me fazia bem caminhar por meio daqueles manequins vestidos melhores que eu, por meio daqueles sapatos lindos e brilhosos de tão caros. Passamos direto, infelizmente!

Ele parou em frente à uma porta e falou algo com um segurança que se encontrava ali. O rapaz, aliás, não me olhava com desconfiança. Talvez porque eu estava com George, não sei. Só sei que era bom sinal e me fazia ter uma ponta de esperança.

Ele parou de falar com o funcionário e entramos em uma espécie de depósito pequeno. Ali estavam várias caixas de cores diferentes. A iluminação era pouca comparada à da loja, mas dava pra ver todos os detalhes do meu pai: ele estava vestido com um uniforme de vendedor. Seus olhos castanhos como sempre, seus cabelos grisalhos caídos pela testa e seu corpo grande como sempre. Ele aparentava continuar bastante forte!

— O que você está fazendo aqui? — me perguntou, com uma calmaria na voz que me fazia lembrar dos tempos que antecederam um dos meus infernos.

— Eu… eu vim procurar um emprego! Não podia continuar desempregado na minha situação. — Fui direto. Não quero que ele pense que eu sou um idiota que dá voltas para o responder.

— E tinha que ser justo aqui? Fala sério, Mark! Você sabia que eu trabalho aqui, não sabia? — Como é que é?

— Não, eu não sabia. E também se soubesse tinha passado longe, porque a última coisa que eu quero é ser humilhado como eu fui alí no meio de todo mundo. — Tinha tanta coisa presa na minha garganta…

— Você já parou pra pensar nas coisas que você vai passar o resto da vida aqui nesta cidade, garoto?

— Sim, George, eu já pensei e também não tenho medo. Eu não sou um covarde que foge da raia como se fosse um rato.

— Isso é algum tipo de indireta? — Sim, era sim!

— O que você acha? Porque pelo seu tom, eu vejo que continua o mesmo de sempre. Foi ela, não foi? Ela quem colocou na sua cabeça que tem que me afastar mais um pouco até não restar qualquer tipo de ligação minha com vocês? — Soltei, sem pensar.

Ele ficou calado, apenas me fuzilando com o olhar. Ele sabia do que eu estava falando, até porque até hoje vive à mercê da Christine como se fosse uma criança. Todas as decisões dela eram como um decreto para ele. George seguia todas, até se fosse para matar alguém.

— Não adianta negar, eu sei muito bem que você não é igual a ela porque quer. Ela te manipula, te faz de gato e sapato. Você… você era meu pai! E de uma hora pra outra você sumiu, me abandonou no momento que eu mais precisei. — A emoção já tinha tomado conta de mim, mas dessa vez eu não derramei uma lágrima sequer. — Você sentia vontade de me apoiar, e hoje eu não preciso me perguntar o porquê de você não ter feito isso.

— As coisas não são fáceis assim, Mark. Eu não podia simplesmente parar de apoiar sua mãe pra dar apoio pra você, quando todas as evidências te apontavam como um assassino. — Que… que mesquinho!

— Eu não estou falando disso. Eu estou falando do que levou até esse ápice, porque vocês todos poderiam estar me apoiando agora se me conhecessem de verdade. Saberiam que eu jamais tentaria matar uma pessoa se não fosse pra me defender. Eu estou falando de anos de negligência, de falta de amor, de falta de carinho… — Ele apenas me escutava, e eu já estava meio alterado. — Sabe o que eu vejo? Eu vejo vocês se aproveitando de uma situação como essa para colocarem pra fora todo desprezo que sempre sentiram pelo que eu sou e pelo que sempre deixei transparecer. Ela com um desprezo genuíno, e você com um desprezo por tabela.

— Você não tenta me entender! — Agora ele estava bastante abalado e eu só sentia vontade de colocar tudo que me feria pra fora.

— Não, muito pelo contrário. Eu entendi sim! Eu entendi que você precisa dela pra ter uma alma. Você sente o que ela sente, você faz o que ela faz, você fala o que ela fala e pior… você não sente vontade de mudar isso, mesmo com uma oportunidade batendo na sua cara agora mesmo.

— Eu não quero perder minha família, Mark! — Ele disse, em um quase choro. Aquilo me atingiu no fundo da alma. Eu apenas fechei os olhos, espremi meus lábios entre os dentes e esperei o impacto passar para olhá-lo novamente.

— Só que você já perdeu sua família há anos atrás, quando um cara resolveu tentar matar o seu filho e vocês preferiram acreditar em uma história distorcida.

Ele ficou calado por alguns segundos, parecia refletir sobre as coisas que acabou de ouvir. Foi nesse momento que eu percebi que talvez ainda possa haver um restinho de esperanças no meu coração de que eu possa chamá-lo de pai algum dia. Eu sabia que ele não era igual a Christine, eu sentia isso quando olhava no fundo dos seus olhos.

Ele iria dizer alguma coisa, mas hesitou por uns segundos, respirou fundo e me olhou logo em seguida. Eu juro que se ele me pedisse perdão agora, eu esqueceria tudo de uma vez, só pra ter de volta essa parte da minha vida, que na verdade era uma das únicas um pouco boas.

— Você… você não mudou nada durante esse tempo. Continua um rapaz bonito e parecido comigo! — não era o que eu queria ouvir, mas não deixei de me sentir feliz ouvindo isso.

— E você continua o mesmo coroa arrumado de sempre! — ele sorriu pra mim. Há muito tempo eu não via um sorriso assim vindo dele, desde muito antes do ocorrido.

— Mark, eu vou te ajudar a conseguir um emprego. Não vai ser aqueles empregos maravilhosos pra ganhar muito dinheiro, mas vai dar pro gasto! — O sorriso agora foi meu. Pelo fato de que seria muito difícil arranjar algum trabalho sem ajuda, mas principalmente porque era ele quem estava me ajudando.

— Você não imagina o quanto isso vai me ajudar! Um conhecido tinha me falado que aqui no shopping estavam precisando de vendedor e resolvi tentar, foi só por isso que eu vim.

— Sua mãe não pode ficar sabendo disso, senão você já sabe! — As mudanças nunca vêm de uma vez, não é?

— Ela não é minha mãe, não mais!

— Ela te colocou no mundo, Mark. — Disse ele, na convicção de que isso iria me fazer voltar atrás.

— E também foi ela quem me tirou do mundo dela ontem. Ela te contou que foi lá na casa da Natalie me acusar de coisas absurdas e me ofender?

— Ela não me contou, mas eu deveria saber que isso iria acontecer. A sua mãe foi muito machucada nesse tempo. Tenta entender, ela perdeu quase tudo por causa dessa situação. Saiu de uma vida boa pra uma vida mais ou menos em alguns anos, é uma mudança muito brusca!

— Eu não entendo, George. E você sabe por quê? Porque no lugar dela eu jamais teria abandonado um filho no momento que ele mais precisava. Eu jamais olharia nos olhos de um filho para chamá-lo de assassino, porque eu iria fazer questão de o conhecer!

— Ela te conhecia muito bem, e era exatamente por isso a decepção.

— Na verdade, a decepção foi justamente por não me conhecer o suficiente. Ela simplesmente me colocou no mundo, jogou as expectativas dela nas minhas costas esperando que eu fosse suprir. Só que eu não nasci com essa obrigação, ela quem colocou na cabeça que eu tinha! 

— É… — Ele respirou fundo e rapidamente enxugou uma lágrima que caiu. — Eu tenho que ir agora. Já tá chegando meu horário de voltar e eu preciso continuar aqui pra te ajudar. Fica preparado, pois caso eu consiga uma vaga pra você, vou lá na casa da Natalie te avisar! — Ele acenou com a cabeça pra mim e rapidamente saiu do depósito.

Eu estava contente demais. George, o meu pai que não via há anos, vai me ajudar a encontrar um emprego. Isso é bom demais pra ser verdade! Sinto que a qualquer momento minha vida vai voltar aos trilhos, pela segunda vez desde que saí daquele lugar eu sinto a vida percorrer pelas minhas veias. De repente estava inevitável me controlar, então comecei a dar uns pulinhos para extravasar toda a alegria que sentia no momento. Meu sorriso era de canto a canto do rosto!










Hoje eu estava com sorte e sem sorte ao mesmo tempo. Se para vir até aqui foi fácil, para voltar estava sendo difícil. Os táxis estavam todos ocupados e pelo visto eu teria que voltar a pé. Sem problemas, aquilo era fichinha perto de todas as emoções de hoje. Eu me sentia leve, mas no fundo ainda havia um peso enorme, peso esse que nem imagino se vou conseguir carregar por muito tempo. A humilhação de hoje deixava ainda mais claro que seria horrível.

O sol estava dando as caras. Era uma delícia sentir aquele vento batendo no rosto, ao mesmo tempo que os raios de sol tratavam de esquentar meu corpo. Provavelmente eram umas três horas da tarde, então não era tão quente. Por estar em uma área onde tinha bastante árvores, as folhas voavam junto com o sopro natural, balançando pra lá e pra cá. Eu amava isso, de verdade. Lembranças vinham na minha mente, e esse clima me fez ter uma péssima idéia, mas eu queria ir até o fim mesmo assim!

Eu sabia qual seria o meu destino agora, e não era a casa de Natalie. Caminhando devagar por uns minutos, consegui avistar de longe a bela praça rodeada de árvores e flores coloridas. Não atoa que o nome daquele lugar era Floral Garden Colors. Continuava tudo muito lindo!

Ainda podia sentir o cheiro do amor junto aos odores diversos das flores. Estar ali era o mesmo que sentir continuamente a sensação de deja vu. Lembrava de cada momento daquele tempo! Entrei no meio daquele paraíso e sentei em um dos bancos que estavam debaixo das árvores e de frente para o centro repleto de flores amarelas, vermelhas e roxas. Fechei meus olhos e pude desfrutar de um dos melhores momentos da minha vida.

Eu podia ver e sentir o dia em que eu e ele saímos da escola direto para cá; nós sempre buscamos vir nos momentos em que a praça estava vazia. Era sempre no finalzinho da tarde, quando os raios de sol estavam invadindo violentamente o espaço por entre as folhas das árvores, aí chegavam diretamente em nossos rostos. A finalidade era estudar, mas no fim sempre estávamos conversando sobre nossas vidas ou então dividindo um amor até então puro e leve.

Podia sentir também o toque das suas mãos em meu rosto. Era delicioso e transmitia uma paz infinita, como se tudo fosse dar certo para sempre, como se nada e nem ninguém fosse atrapalhar o nosso destino.

Como nem tudo são flores, agora eu estava conseguindo sentir a péssima sensação de cada uma das nossas discussões nesse belo cenário. Elas eram pesadas, por vezes nós ficávamos sem nos falar por semanas, até meses.

Antes de flagrar um de nossos beijos, o pai do Matthew, aquele que tinha uma reputação a zelar, sempre foi um bruto, queria fazer com que o herdeiro se casasse com qualquer uma. Ele já devia saber que o filho não ia seguir seus passos de machão pai de família, então tentou o obrigar pra manter uma aparência. Qualquer desvio daquela linha era algo abominável, então por isso tive que me submeter à uma vida escondida. Tudo isso por amor ao meu futuro algoz.

Todos esses pensamentos foram embora assim que senti uma presença ao meu lado. Poderia ser algum fantasma, mas é algo mirabolante demais para ser verdade. Na verdade poderia ser tudo, menos ele!

Resolvo criar coragem para abrir os olhos e prestar atenção ao meu lado: ali estava Mitchell, sorrindo lindamente em minha direção. Sentado, ele usava uma bermuda bege, uma camisa de um azul pouco forte. Okay, ele estava lindo, mas o que mais me chamou atenção foi o fato dele estar de chinelos na rua. Normalmente em uma cidade tão fria como Failland as pessoas usam sapatos, botas ou pantufas o dia inteiro. Era de se admirar!

— O que faz aqui, Mark? — me pergunta ele, de forma simpática.

— Eu estava vindo do shopping e não consegui um táxi. Daí resolvi dar uma passada aqui! Você acredita que eu vinha muito nesse lugar? — disse, sorrindo.

— Eu acredito sim, primeiro porque esse lugar é divino. Segundo porque eu te entendo, já que venho sempre aqui desde que mudei pra essa cidade!

— Nossa, é sério? Então temos algo em comum! — sorri para ele, que ficou ainda mais animado.

— Talvez não seja apenas isso. Talvez existam outros pontos em comum que vamos descobrir com o tempo! — não estou acreditando que ouvi isso. Meu deus do céu, vou começar a tremer!

— Eu… eu tenho certeza que vamos descobrir sim! Aliás, quais suas flores preferidas daqui? — estava nervoso. Não podia dizer qualquer coisa, mas também não podia deixar o papo morrer!

— São as tulipas. Elas são muito lindas e delicadas, ao mesmo tempo que são resistentes para se manterem de pé. Sabe que elas me lembram você? É inacreditável que você siga tão forte nessas circunstâncias… eu realmente te admiro muito. Sei muito bem como é horrível ser desacreditado por todos! — eu estava viajando nas palavras dele. Eram reconfortantes, elas me faziam gritar internamente!

— Poxa… eu te agradeço por todas essas palavras. Você não imagina o quanto me deram um conforto enorme agora! E a propósito, as minhas favoritas também são as tulipas. Exatamente pelos mesmos motivos que você citou! — estávamos rindo como duas crianças dividindo uma alegria.

— Tá brincando? — pra ele receber aquela informação era como se fosse receber um prêmio na loteria. Era nítido, e aquela empolgação me chamava atenção, era muito bonita de ser ver, era admirável em tempos como esses. — Mais um ponto em comum, tá vendo? Espero que encontremos mais e mais!

Eu estava nervoso e um pouco desconfiado, confesso. Não pelo caráter dele, porque isso eu já percebi que é um dos melhores pontos que ele tem. Minha dúvida era a seguinte: será que ele estava interessado em mim? Porque geralmente esse comportamento é de alguém que tem interesse em você. Mas ao mesmo tempo penso que é só uma maneira dele me deixar confortável com ele até que surja uma amizade, porque querendo ou não é de se estranhar um homem como o Mitchell, com um porte daquele, todo forte pelo menos fisicamente, sendo tão fofo com alguém, principalmente comigo. Resolvo parar de pensar sobre isso e sigo a conversa.

— Eu também espero! Mas me conta mais sobre você. De onde você vem, o que faz atualmente… estou curioso! — pergunto, retribuindo toda a gentil empolgação. Ele apenas sorria!

— Eu venho de Nova Jersey. Morei lá até meus dezenove anos, em Cape May, conhece? — assinto com a cabeça e o ouço atentamente. — Depois mudei pra Winchester, na Virgínia. Até que um dia resolvi vir pra cá por ser uma cidade ainda menor. Gosto da ideia de morar em uma vila que seja chamada de cidade! — tive que rir daquele comentário. Realmente Failland era como uma vila de tão pequena. Eu podia ir na esquina e conversar com alguém, uma hora depois eu iria encontrar essa mesma pessoa em outro lugar.

— Eu sinto muito, mas você provavelmente fez a pior escolha da sua vida vindo pra cá! — ele sorri e concorda com a cabeça, porém me olha no fundo dos olhos.

— Talvez tenha sido mesmo a pior escolha, mas ao mesmo tempo foi a melhor. Conheci pessoas maravilhosas que quero perto de mim pra sempre! — achei algo bastante sensível da parte dele. Essas pessoas com toda certeza eram sortudas demais! Ainda me admirava por ver um homem daquele sendo tão delicado dessa forma.

— Essas pessoas são bastante sortudas, então! — ele sorri, envergonhado.

— Mas e aí, você conseguiu alguma coisa no shopping? — ele parecia bastante curioso.

Não vou contar o que aconteceu com os seguranças lá, não quero que ele pense que sou um fraco que fica chorando pelos cantos. Vou superar tudo isso sem me lastimar o tempo todo.

— Ah, por enquanto eu não consegui nada, não. Mas você sabe que foi produtivo eu ter ido lá? Reencontrei meu pai, ele trabalha em uma das lojas e disse que vai me ajudar! — Mitchell prontamente ficou feliz, com um sorriso de canto a canto do rosto. Sorriso lindo, por sinal!

— Que coisa boa, Mark! Eu espero que dê tudo certo pra você. Com o seu pai, e com o trabalho. Eu já trabalhei de vendedor e posso te ajudar dando umas dicas, sabe? — Aquelas palavras me deixaram mais confiante. Não esperava menos do Mitchell, afinal ele sabia o que falar em todos os momentos. Arrisco a dizer que nunca alguém iria passar pela vida dele sem receber a ajuda que precisa.

— Ah, eu agradeço demais e vou aceitar. Quando fui preso nem o ensino médio tinha terminado ainda, tive que concluir atrás de umas grades. Chega a ser irônico eu terminar os estudos preso quando sempre falei que a escola era um tipo de prisão! — Ele deu uma gargalhada gostosa, me contagiando no mesmo momento. Eu estava amando tudo isso!

— Eu também sempre falava isso. Inclusive meu ensino médio foi bem difícil, igual deve ser na cadeia.

— Olha, se foi difícil igual lá, então deve ter sido a pior coisa da sua vida. — Ele deu uma risada e me olhou.

— Esqueci que você já viveu isso na pele. Me perdoe!

— Não, imagina, sem problemas! Eu não me sinto mal em falar sobre isso, sabe? Me sinto mal quando as pessoas usam isso pra me ferir ou me julgar. — Disse, meio tímido. Não gosto de deixar transparecer minhas fragilidades, por incrível que pareça.

— Então pode ficar tranquilo, porque eu jamais faria isso. Ainda mais com você!

— Por que "ainda mais com você"? — Foi automático. Me arrependi de ter perguntado quando o vi ficar corado e nitidamente envergonhado. Qual é, Mark!

— Porque eu jamais teria coragem de te machucar. Você, de todo mundo que conheço, é quem eu mais admiro e que mais sinto vontade de proteger! — Internamente eu estava praticamente morrendo. Minhas mãos estavam suando e meu coração batendo muito forte. De onde saiu esse homem?

— Então você quer me proteger? Me diga como faria isso! — Resolvi arriscar na maior cara de pau. Eu gostava de superar meus medos.

— Primeiramente eu quero fazer você se sentir seguro. Assim, ó! — Lentamente ele se aproximou de mim, me olhando por todos os segundos.

Senti o seu abraço terno e delicado. Seus braços me envolviam e eu, já emocionado, retribuí o gesto com ainda mais carinho. Era quentinho e reconfortante, me fazia querer ficar ali pelo resto da vida. Senti um beijo no meu pescoço que me fez arrepiar inteiro. Seus lábios eram como sedas fogosas acariciando minha pele devagar. Era tudo que eu precisava, e ele sabia disso. Ele me proporcionou talvez o melhor momento desde que saí da "escola".












Pensando bem, colocando todos os pontos na mesa, minha vida estava suportável. Era de se estranhar, mas talvez se eu não pensasse nisso a tendência seria só melhorar. Em poucos dias de liberdade, afastei minha mãe, aproximei meu pai, conheci uma pessoa bastante legal como o Mitchell e minha relação com tia Natalie seguia maravilhosamente bem. Era assim que eu queria continuar!

Lá estava eu, entrando em casa. Era quase noite, mais ou menos umas seis horas. Depois daquele abraço perfeito, eu e Mitchell conversamos bastante sobre a vida. Ele me contou umas histórias que me fizeram rir bastante. Eu também contei uns acontecimentos da cadeia que o deixou chocado. No fim era isso, ele contava alegrias e eu contava desgraça. Havia um equilíbrio haha

Natalie estava sentada no sofá e me viu entrando. Animada, correu em minha direção e me deu um abraço daqueles que eu amo. Me olhou com aqueles olhos da cor do mar, fazendo eu me sentir ainda mais acolhido.

— E então? Como foi? — Me perguntou, entusiasmada. Nos sentamos no sofá e eu segurei nas mãos dela.

— Ah, por hora não consegui alguma coisa, minha tia. Mas você não vai acreditar no que aconteceu! Reencontrei meu pai depois de muito tempo, e o mais incrível de tudo é que senti nele uma confiança nele, uma vontade de desabafar tudo de uma vez, e foi o que fiz! — Eu estava muito entusiasmado com essas notícias. Eram as melhores em muito tempo, então teria que aproveitar ao máximo.

Natalie me olhou bastante contente e, ao mesmo tempo, preocupada. Ela sabia que eu poderia me machucar nessa história. No fundo eu também sabia disso.

— Mark, tome muito cuidado com esses assuntos. Você sabe bem que seu pai… seu pai é um pau mandado. Pronto, tive que falar! — Ela estava nervosa, provavelmente por pensar que eu iria ficar chateado pela constatação óbvia. Eu só conseguia sorrir de alegria pela preocupação!

— Eu sei muito bem como é que o George vive. Ele está sempre na aba da Christine. Pode ficar tranquila, eu vou tomar bastante cuidado porque sei onde estou me enfiando. Pode me fazer bem, e pode me fazer mal!

Ela sorriu e se acalmou. Agora seu rosto já mantinha uma expressão indecifrável, começando com uma seriedade enorme.

— O que houve? — Tive que questionar, estava me assustando já.

— É que eu tenho uma notícia que eu não sei se você vai gostar de ouvir… — Agora eu já notava um risinho cínico em seu rosto.

— Diz logo, tia. Estou começando a ficar assustado!

— Você sabe que eu prometi te ajudar, não é? — Ela deu pausa de alguns segundos e ficou me olhando. Parecia uma eternidade, eu já estava enlouquecendo por dentro, porque por um momento estava desconfiando da pessoa que mais me apoiou esse tempo todo. — E eu vou. Olha só o que comprei pra você!

Ela tirou da almofada por detrás dela uma caixa envolta em um papel de presente de cor avermelhada. O embrulho brilhava mais do que tudo. Me senti mega feliz e logo tratei de pegá-lo de suas mãos. Olhei pra ela e os seus olhos diziam para eu abrir logo aquele presente. Foi o que fiz! Comecei a desembrulhar aquela pequena caixa e, logo em seguida, me surpreendi: havia uma caixa de celular ali. E não era qualquer celular, era um daqueles de última geração que fazem os olhos da população encherem de vontade.

Eu sorri. Sorri como uma criança ganhando o brinquedo dos sonhos; Sorri como um adolescente seguindo as modinhas mais instigantes de sua época; Sorri como um adulto pobre conseguindo um emprego fixo.

Natalie me viu emocionado e me deu mais um de seus abraços maravilhosos. Eu desabei novamente, já estava virando rotina. Porém, dessa vez, houve uma exceção: estava chorando de felicidade. De contentamento, de esperança, de alegria… eram sentimentos bons.

— Você tem noção do que isso aqui representa pra mim? Isso aqui é simplesmente o maior presente que recebi em tempos. E não é por ser um objeto, não. É muito maior que isso, é algo sentimental, abstrato, você fez eu me sentir assim, e são coisas boas. Ao menos dessa vez são coisas boas! — Ela simplesmente concordou com a cabeça e me abraçou novamente. Passamos muito tempo assim e foi revigorante.












O jantar tinha sido bem agradável naquela noite. Natalie e eu jantamos bife com batata frita e salada. Foi pedido, claro, porque nem ela e nem eu estávamos com cabeça para cozinhar depois de tantas emoções. Era uma delícia comer algo assim após tantas refeições repetidas e mal feitas no presídio. Meu mundo não era aquele, eu não me sentia conformado ao comer aquilo simplesmente pelo fato de que não era eu quem tinha que comer. Se eu tivesse mesmo feito o que falam que fiz, comeria sem reclamar e ainda pediria para repetir.

Porém, como o ser paciente que sou, tento partir sempre do princípio "os humilhados serão exaltados", daí que vem minha perseverança, mesmo que pouca. Me surpreendi comigo mesmo, finalmente descobri em mim algo que sempre disseram que eu não tinha: força. Não é querendo me gabar, mas talvez um pouco de narcisismo seja essencial; você é forte e bonito, Mark. Leva isso em consideração quando alguém querer te colocar pra baixo!

Estava na cozinha, sozinho. O relógio marcava duas e quarenta e cinco da tarde. Tia Natalie tinha ido trabalhar e eu fiquei esperando alguma notícia de George. Quanto ao Mitchell, uma parte de mim esperava ele aparecer ali, talvez para conversar, talvez para finalmente fazer umas coisinhas. Não que eu pensasse em usá-lo e deixá-lo de lado, nada disso. Eu queria aproveitar bem todos os momentos com ele, porque minha situação não era propícia para esperar o destino agir.

A campainha toca e todos os meus devaneios vão pelo ralo. Pensar estava se tornando uma mania bem louca e eu estava enlouquecendo junto com a mania. Sem pensar, fui diretamente até a porta e abri, dando de cara com ninguém mais, ninguém menos que George. Sua expressão não era muito boa e já me preparava para a notícia que provavelmente viria a seguir.

— Mark… — Ele parou por uns segundos e me observou bem. Eu já sentia a notícia ruim vindo, mas tratei de me recompor e manter a cabeça erguida para recebê-la.



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