A OUTRA

CAPÍTULO 12

UMA NOVELA DE TAÍS GRIMALDI


CENA 1. RUA DO LEBLON. EXT. NOITE

 

SONOPLASTIA – “ABRÁZAME ASÍ” – ROBERTO CARLOS.

A rua elegante, silenciosa, no coração do Leblon. A luz dos postes desenha sombras nos rostos de Márcia e Giuseppe, frente a frente, depois de tantos anos.

MÁRCIA - (áspera, voz embargada) O que você tá fazendo aqui? Vinte e cinco anos, Giuseppe. Vinte e cinco. E você não teve coragem de me visitar uma vez sequer na cadeia. Nem uma.

Silêncio.

Giuseppe abaixa o olhar. Seu rosto endurecido vacila por um segundo. Ele dá um passo à frente, hesita, estende a mão, quase toca o braço dela. Quase.

Márcia recua, gelada.

MÁRCIA – (cínica) Vai fazer o quê agora? Me abraçar como se fosse ontem? Como se você não tivesse me apagado da sua vida com a facilidade de quem arranca uma página ruim de um livro?

GIUSEPPE - (engolindo a vergonha) Eu acreditei naquele bilhete, o Bruno escreveu (pausa) tava tudo lá...

MÁRCIA - (sarcástica, cruel) Um bilhete, Giuseppe. Um pedaço de papel. Você preferiu o papel à mulher que dormia do seu lado. A sua lealdade durou o quê? Dois dias?

GIUSEPPE - (em voz baixa, arrasado) Eu fui um idiota...

MÁRCIA - (interrompe, gélida) Foi. E foi rápido. Dois anos depois, você já tava casado. Casa, filhos, Natal em família, foto com laço vermelho. Enquanto eu contava as rachaduras da parede da cela. Achando que, uma hora ou outra, você ia aparecer. Mas você nunca apareceu.

GIUSEPPE - (começa a chorar, a voz falha) Eu me culpo por isso todos os dias, eu não sei como...

MÁRCIA - (corta seco, ríspida) Engole o choro. Você não tem direito a ele.

Giuseppe tenta falar, mas o choro prende. Ele abaixa a cabeça, vencido.

MÁRCIA - (sem piedade, sussurra) Você me enterrou viva, Giuseppe. E agora quer trazer flores pro túmulo?

Ela vira as costas, caminha na direção oposta, sem olhar para trás.

CÂMERA FIXA EM GIUSEPPE, chorando no meio da rua, pequeno diante da mulher que ele abandonou — e que sobreviveu.

CORTE SECO PARA:

 

CENA 2. PALÁCIO DAS LARANJEIRAS. HALL DE ENTRADA. INT. NOITE

 

O Palácio das Laranjeiras impõe respeito. Os vitrais refletem a luz amarelada dos lustres de cristal. A escadaria central, ampla, curva, em mármore branco com corrimão de bronze polido, domina o ambiente como um trono silencioso. Silêncio pontuado apenas pelos passos elegantes de stella e Eriberto que acabam de entrar.

Stella usa um vestido longo, de seda azul-petróleo, maquiagem impecável, rosto inexpressivo. ERIBERTO veste um terno italiano sob medida, gravata de tom sóbrio, ares de príncipe republicano.

STELLA - (cansada, sem disfarçar o tédio) Eu vou subir. Antes de vir pra cá, ainda precisei resolver mais um escândalo da Marisa. Ela quer transformar qualquer assunto em trending topic. Como se alguém fora da bolha ligasse.

Eriberto caminha até ela, afaga o braço da esposa com gestos meticulosamente calculados. Os dois parecem bailarinos de um tango sem música — cúmplices, frios, elegantes.

ERIBERTO - (olhar de sedutor profissional) Toma um uísque comigo antes. É quinta-feira. Quinta-feira combina com Glenfiddich e conspiração.

Stella sorri levemente. Um sorriso contido, protocolar, como quem cumpre um ritual conhecido.

STELLA - (sarcástica) Você só me oferece uísque assim quando quer que eu faça alguma coisa.

ERIBERTO - (sem negar, com charme) Você me conhece. E conhece o jogo. (pausa, olha nos olhos dela) O campo progressista tá fechado com você. Querem você como interlocutora. Pra ontem. Com foco em dois mil e vinte e seis.

Stella cruza os braços. Reprime outro sorriso. O jogo a excita.

STELLA - (sem hesitar) Claro. Só preciso saber quem eu devo destruir primeiro.

Eriberto ri, encantado e temeroso. O casal se beija — um beijo sem paixão, mas cheio de poder.

CORTA PARA:

CENA 3. COPACABANA PALACE. BAR. INT. NOITE

SONOPLASTIA AMBIENTE  "JE T’AIME… MOI NON PLUS" - SERGE GAINSBOURG E JANE BIRKIN.


Ambiente elegante, carregado de história. O bar reluz com espelhos, mármores e luzes douradas. Três mulheres de preto, poderosas e perigosas.

Zilda Maria, num vestido Chanel sóbrio, brinca com a taça de dry martini.
Laurinha, de longo preto de veludo, está com um gin tônica, o cabelo preso num coque escultural.
Conversam em francês murmurando quando
 Consuelo entra — óculos escuros, um turbante, colares demais e um sorriso cínico no rosto. Uma Viúva Porcina versão alta-roda, com a crueldade de Odete Roitman e a teatralidade de Perpétua.

ZILDA MARIA  - (seca, olhando de cima) Ah, chegou a matriarca da futura República. Se, claro, o passado não resolver sair do túmulo ou se a Laurinha resolver parar de bancar a benfeitora de campanha.

CONSUELLO  - (tirando os óculos com charme debochado) Boa noite, queridas. Estava com saudade da nossa mesa redonda da amargura. Mas, Laurinha, ainda nesse luto eterno? Parece a Perpétua versão 2025. Quer uma cueca do Eriberto pra dormir abraçada?

LAURINHA  - (sorri, irônica, sem alterar o tom) Não preciso. Prefiro olhar pros frutos que ele deixou em mim: Sibeli e Roberto. Mesmo que ele finja que não sabe de onde eles vieram.

CONSUELLO  - (num riso alto, exagerado, teatral) Ah, os bastardos da esperança! Você devia patentear: mecenato emocional. Financia o pai, sonha com o marido, cria os filhos sozinha. É um tripé de sofrimento clássico. Uma santa barroca.

ZILDA MARIA  - (com o olhar cravado em Laurinha) E ainda ajuda a eleger o homem que te varreu pra debaixo do tapete persa. Isso é o que eu chamo de masoquismo com pedigree.

LAURINHA - (levanta a taça com classe, mirando Consuello) Melhor ser refinada na dor… do que vulgar na vitória.

CONSUELLO - (num sorriso gelado) Mas quem disse que eu ganhei? Querida, a gente só sabe quem venceu quando a taça quebra no chão.

As três brindam. O cristal tilinta. O silêncio é carregado. Música segue ao fundo. Um garçom se aproxima, constrangido. Elas não se olham mais. Sabem que o jogo é muito maior.

CORTE RÁPIDO PARA:

CENA 4. TENNIS ROUTE – CENTRO DE TREINAMENTO DE TÊNIS. QUADRA PRINCIPAL. EXT. NOITE


SONOPLASTIA – “MY OH MY” – KYLIE MINOGUE FEAT. BEBE REXHA & TOVE LO - INSTRUMENTAL

CÂMERA DRONE sobrevoa o complexo de quadras iluminadas artificialmente. A imagem mergulha em direção ao centro da ação: sibeli, sozinha, treina com intensidade quase ritualística.

MONTAGEM VISUAL – Câmera baixa (contra-plongée), giro de 360º ao redor do corpo de Sibeli, close no olhar duro, nos dedos firmes, nos ombros tensos. A câmera capta suor, respiração ofegante, expressões mínimas, um momento quase imperceptível de dor no olhar.
Tudo nela vibra com energia contida – a raiva, o luto, a resistência.
O som da bola ecoa como um tiro a cada raquetada.

Arthur, técnico e amigo de longa data, observa da lateral. Aproxima-se com calma, uma garrafa de água na mão.

ARTHUR - (voz serena, cortando o ar tenso) Você tá batendo como quem quer esquecer. Não como quem quer vencer.

SIBELI - (sem parar, sem olhar) Talvez eu só (pausa) não esteja pronta pra voltar.

ARTHUR - Dois anos fora (pausa) Você era a número dois do mundo. Essa não é você.

Ela para. Segura a bola por um instante.
Silêncio. O som urbano distante se insinua. Um trem passando. Um cachorro latindo ao longe.

ARTHUR - (baixo, insistente) O que te afastou das quadras? De verdade?

SIBELI - (vira-se devagar, encara-o com dureza) Você não quer saber, Arthur.

Ela o ultrapassa sem esperar resposta.


CORTA PARA:

 

CENA 5. TENNIS ROUTE – ESTACIONAMENTO. EXT. NOITE


SONOPLASTIA – SOM DA CIDADE AO FUNDO, RUÍDOS DE AVIÕES DISTANTES, UM BAIXO ELETRÔNICO DISCRETO MARCANDO A TENSÃO

 

Arthur se aproxima do carro. A porta do passageiro se abre: Paula Lee está ao volante, elegante e feroz mesmo à luz dos postes. Ela fuma um cigarro eletrônico que brilha azul no escuro.

PAULA LEE - (natural, sem virar o rosto) Ela não te contou, né?

ARTHUR - (suspira, entrando no carro) Claro que não. Tem algo ali. Algo muito pesado.

PAULA LEE - (dá partida no carro, mas não sai) Você não faz ideia. Mas eu conheço esse olhar. Sei o que é carregar um trauma tão fundo que começa a vazar por todos os poros, até virar sua nova pele.

ARTHUR - (curioso, tocado) O que foi que aconteceu com você, Paula?

Ela encara o retrovisor. O reflexo mostra seus olhos marejados. A voz, no entanto, sai fria.

PAULA LEE - (sem piedade de si) Meu pai. Quando eu tinha dezesseis anos, ele me treinava como se eu fosse um projeto. Não uma filha. Cada movimento meu era ensaiado. Cada erro, punido. Com palavras. Com silêncio. Com (pausa) outras coisas.

Arthur engole seco.

PAULA LEE - (continuando, mais dura agora) Quando você é uma menina com talento, vira patrimônio. Da família, da federação, do país. E ninguém quer saber se seu corpo ainda é seu.

Silêncio. O motor ronrona, parado.

ARTHUR - E a Sibeli…?

PAULA LEE - (olha pela janela, baixa a voz) Ela vai contar. Uma hora. Quando estiver pronta. Mas não pressione. A gente quebra diferente dos homens.

Corte para a rua – O carro parte suavemente, deixando para trás a quadra iluminada.

Sonoplastia – eco distante da batida de “My Oh My”, como se viesse do fundo de um pesadelo.

CORTE PARA:

CENA 6. APARTAMENTO DE EVELYN. SALA DE ESTAR. INT. NOITE


SONOPLASTIA — “BITTER SWEET SYMPHONY”  - INSTRUMENTAL, CORDAS SUAVES, CLIMA DE ELEGÂNCIA DECADENTE

 

O apartamento de Evelyn é um reflexo da dona: discreto, sofisticado, com vestígios de uma fortuna em declínio. A iluminação é quente, mas rarefeita. Uma garrafa de vinho meio vazia sobre a mesa. O som dos violinos se mistura com o tic-tac de um relógio antigo.

Márcia caminha pela sala, inquieta. Segura uma taça, mas não bebe. Os olhos estão vermelhos — não de choro, mas de insônia. Ela gira a aliança no dedo, um gesto nervoso.

Evelyn, sentada no sofá, observa com atenção de quem já viu muito. Um silêncio pesado entre elas. Evelyn serve mais vinho.

MÁRCIA - (baixa, pensativa) Você falou da minha sobrinha (pausa) A Marisa. Como ela está?

EVELYN - (sem disfarçar a gravidade) Escondem. Fazem de tudo pra ninguém perceber. Mas a verdade é que ela está viciada. Opioides. Começou com uma lesão — depois foi só ladeira.

MÁRCIA - (se vira, surpresa e magoada) A Stella nunca me disse nada. (RI) Faz vinte e cinco anos que ela não fala comigo.

EVELYN - Você conhece a Stella. Pra ela, aparência é tudo.
(pausa) Mas o que me preocupa é o que a Marisa sabe.

MÁRCIA - Ela não estava lá, era um bebê.

EVELYN - Não. Mas Stella contou alguma coisa. Eu sei. A Marisa repete frases, menciona detalhes que só quem ouviu a versão da Stella conhece. Eu a entrevistei algumas vezes. 

MÁRCIA - (se senta lentamente, como se uma verdade lhe caísse sobre os ombros) Então a Marisa pode saber a versão da minha irmã sobre aquela noite.

Câmera lenta no olhar de Márcia. Há mais do que preocupação — há culpa, desejo de confronto, e uma necessidade amarga de justiça.

EVELYN - (séria, quase num sussurro) Talvez seja hora de falar com ela. Antes que o vício apague o que ela sabe ou pior: antes que alguém faça isso por ela.

Close em Márcia, seus olhos marejados. A trilha cresce levemente. Cordas e memória.

CORTA PARA:

 

CENA 7. VITRINNI LOUNGE BEER. INT. NOITE

 

SONOPLASTIA – “MY OH MY” – KYLIE MINOGUE FEAT. BEBE REXHA & TOVE LO.


Batida eletrônica, feminina, sensual. Um hino decadente e provocador.

IMAGEM 1 – CORTE RÁPIDO / REELS


Câmera em plongée. MARISA (23), hipersexy, os olhos pintados de glitter, dança na cabine do DJ com os braços erguidos. Os celulares filmam. No visor: “Marisa X Vitrinni – Midnight Set 
🔥🎧”.

 

IMAGEM 2 – STORY / 8 SEGUNDOS


MARISA derrama vodka na própria boca e beija STU DA QUEBRADA, jovem tenista negro, tatuado, sedutor. Câmera na mão, em giro. Flashes. Mãos se tocam, corpos colam. Texto na tela: “
🔥🔥🔥Não é possível o que ela tá fazendo”.

 

IMAGEM 3 – STORY / 7 SEGUNDOS


MARISA deitada sobre o sofá de veludo. Luz vermelha. Risos. STU tira o blazer, outros dois amigos entram na cena. MARISA grita:
MARISA - (rindo, exausta) Só vou parar quando minha tia explodir uma bomba na RedeTV!

 

IMAGEM 4 – POST / FEED


Foto tremida, fora de foco: Marisa no banheiro feminino, retocando a maquiagem com olhos vermelhos. Legenda: “A última it girl do Leblon está indo pro buraco. Estão escondendo, mas a coisa tá feia.”
#decadência #marisanoinsta #elafoi

IMAGEM 5 – VÍDEO / 6 SEGUNDOS


STU e MARISA dançando colados, ele sussurra no ouvido dela. Ela ri alto e joga bebida pra cima. Gritos, música ensurdecedora. Uma amiga grita “MARISA!!!” e ela responde apenas mostrando o dedo do meio, glamourosa, intoxicada e destrutiva.

PLANO FINAL – LENTE CINEMASCOPE A câmera se afasta da boate pelo vidro, ainda captando a batida abafada da música. A chuva começa a cair sobre a calçada do Leblon. MARISA está no olho do furacão e não sabe. Ou sabe, e prefere dançar.

CORTA PARA:

 

CENA 8. RIO DE JANEIRO. EXT. AMANHECER

 

SONOPLASTIA – “MY OH MY” – KYLIE MINOGUE FEAT. BEBE REXHA & TOVE LO -INSTRUMENTAL

 

PLANO AÉREO da cidade acordando. O sol nasce por trás do Pão de Açúcar, banhando a Baía de Guanabara em tons dourados e rosados. Copacabana se espreguiça sob a luz tênue; o Palácio das Laranjeiras se destaca imponente, silencioso.

CORTE PARA PLANO MÉDIO EXTERIOR: Um carro preto de luxo para diante dos imponentes portões de ferro do palácio.

PLANO DETALHE NOS PÉS: Saltos altos abandonados no chão, marcando o caminho irregular pelo gramado molhado pelo orvalho.

PLANO MÉDIO CLOSE UP NO ROSTO DE MARISA, 25 anos: Olhos marejados, expressão entre a euforia e o abandono, pele marcada pela noite. O batom falha em esconder a maquiagem que escorreu.

Ela segura o celular com dedos trêmulos, os olhos fixos na tela. A luz azulada do aparelho ilumina seu rosto com uma aura fantasmagórica.

PLANO DETALHE NA TELA DO CELULAR: Texto digitado — “Good morning reality 💋🧸 #laranjeiras” — mas não é exibido explicitamente; o foco é no movimento frenético dos dedos e no brilho intermitente do visor.

PLANO GERAL: Marisa caminha cambaleante, os passos hesitantes, enquanto o portão se fecha atrás dela com estrondo metálico.

PLANO CONTRAPLONDO: No fundo da varanda, Stella — mãe de Marisa — observa imóvel. O rosto dela é uma máscara rígida, como mármore envelhecido, impenetrável. A luz do amanhecer desenha sombras profundas no rosto austero.

PLANO DETALHE NA MÃO DE STELLA: Um copo vazio repousa sobre o parapeito. A mão não treme, mas há uma tensão invisível no aperto.

PLANO MÉDIO EM MARISA: Ela ri alto, um som que ecoa pelos corredores vazios do palácio. A risada parece um desafio lançado contra o silêncio pesado do lugar.

PLANO GERAL LENTO: A câmera se afasta, subindo, mostrando Marisa minúscula diante da enorme fachada do palácio — uma ilha caótica num mar de luxo e decadência.

MÚSICA DIMINUI AO FUNDO, SILÊNCIO LEVE.

CORTE PARA:

CENA 9. PALÁCIO DAS LARANJEIRAS. HALL DE ENTRADA. INT. DIA

O saguão é amplo, austero, com colunas neoclássicas e móveis de época. Marisa, de óculos escuros e ressaca evidente, entra arrastando uma malinha de rodinhas barulhenta. Consuelo e Stella a esperam, impecáveis.

CONSUELO - (tom cortante) Pelo menos teve a decência de vir vestida.

MARISA - (cínica) E perder a chance de ser expulsa de novo? Nunca.

STELLA - (baixando os óculos, examinando Marisa) Vai precisar de três banhos e um exorcismo.

CONSUELO - (dura) A partir de agora, disciplina. Você vai dormir cedo, acordar cedo e — principalmente — obedecer.

Ela acena. Surge Mário, o novo segurança. Imponente, calado, mas com um olhar curioso.

CONSUELO - Este é o Mário. Responsável por garantir que você não fuja, nem leve ninguém contigo.

MARISA - (olha de cima a baixo, debochada) Parece mais segurança de motel do que de palácio.

MÁRIO - (sem hesitar) E você parece mais problema do que hóspede.

STELLA - (sorrindo com gosto) Que comece a guerra.

CORTA PARA:


Marisa passa pelo segurança com um leve esbarrão. Mário não se move. Só a observa. A tensão entre eles é elétrica. Clima de jogo perigoso.

CORRTA PARA:

CENA 10. APARTAMENTO DOS FERRAZ DINIZ. QUARTO DE MARCELO. INT. DIA

A luz entra pelas frestas da janela, revelando um quarto impecavelmente arrumado, mas impessoal. Um lugar onde nada parece realmente habitado.

GIUSEPPE observa o filho sentado na beira da cama, tenso. Entre os dois, o abismo de uma verdade contida.

GIUSEPPE - (tentando soar leve) Você anda calado demais, Marcelo. Até parece que puxou a sua mãe.

MARCELO - (olhar fixo no chão) Eu puxei você, pai. Em silêncio. Em esconder as coisas.

Giuseppe se senta ao lado dele. Pausa. O silêncio pesa.

GIUSEPPE - Quer me contar o que é?

MARCELO - (encarando o pai, com esforço) Eu sou gay, pai.

Giuseppe não reage de imediato. Não desvia o olhar. O filho baixa os olhos, esperando o julgamento.

GIUSEPPE - (sério, firme) Você é meu filho. Isso é o que importa. E eu amo você. Do mesmo jeito.

MARCELO - (a voz embargada) A mamãe, ela vai me odiar.

GIUSEPPE - (firme, sem hesitar) Ela vai ter que aprender a conviver com a verdade. Se não conseguir é problema dela.

Giuseppe coloca a mão no ombro do filho.

GIUSEPPE - (continuação) Eu não vou deixar você passar por isso sozinho. Nós vamos enfrentar juntos.

MARCELO - (pela primeira vez, sorri de leve) Obrigado, pai.

Giuseppe levanta, beija a testa do filho e sai, deixando Marcelo sozinho, emocionado. Pela janela, o sol bate com força. A verdade, enfim, entrou no quarto.

CORTA PARA:

 

CENA 11. COBERTURA DE ZILDA MARIA – SALA DE ESTAR – INT. DIA

 

Leblon. Uma cobertura de colunas de mármore, lustres venezianos e tapeçarias gastas de tanto luxo antigo. O tempo parou ali — exceto para o dinheiro. Zilda Maria, em seu vestido de seda verde-musgo, está sentada à mesa com um bule de prata e chá de bergamota. O telefone fixo toca. Ela atende com elegância amarga.

ZILDA MARIA - (alô seco, clássico) Alô.

Corte para um close de seus olhos arregalando, suavemente.

PAOLA - (voz na linha, firme, baixa, com sotaque europeu) Alô, Zilda.

Silêncio. Um suspiro quase imperceptível atravessa os lábios da velha matriarca.

ZILDA MARIA - (baixa, pasma) Paola? Você está viva?

 

CORTE MUITO RÁPIDO PARA:

 

CENA 12. ALEMANHA – MANSÃO FRENTE AO MAR – EXT./INT. DIA

 

SONOPLASTIA — "MY OH MY" – KYLIE MINOGUE FEAT. BEBE REXHA & TOVE LO.

 

Uma mansão de vidro e concreto à beira do Mar do Norte. Minimalismo brutalista com arte moderna e uma estátua grega na varanda. O céu nublado. No interior, Paola surge com um body de seda vinho e óculos escuros. Caminha até a janela, taça de champanhe em punho.

Ela fala ao telefone, agora em foco.

PAOLA - (impávida) Fiquei viúva, Zilda. O funeral foi ontem.(pausa) Está na hora de eu voltar pra casa.

Ela desliga com a mesma elegância com que termina um jogo de xadrez. A câmera se afasta, revelando ao fundo o mar cinzento. Ela fecha as cortinas lentamente.

CORTE PARA:

 

FIM

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