A OUTRA

CAPÍTULO 18

UMA NOVELA DE TAÍS GRIMALDI


CENA 1 – PALÁCIO GUANABARA. ESCRITÓRIO DO GOVERNADOR. INT. DIA
(continuação)

ERIBERTO - (mais duro agora) Você me disse que tomava os comprimidos, Alice.

ALICE - (sem se levantar, com uma risada amarga) E eu tomava. Mas às vezes, entre um gin e outro, eu esquecia. (pausa) Ou queria esquecer.

ERIBERTO - (irritado, voltando a encará-la) Você tem noção do que isso significa? Uma grávida alcoólatra? Uma amante desequilibrada? Isso pode arruinar a minha campanha presidencial!

ALICE - (seco) Eu nunca fui só sua amante, Eriberto. (suspira) E se você tá tão preocupado com o escândalo, relaxa. Eu vou resolver isso. (frio, firme) Vou abortar.

Silêncio. Um silêncio cortante.

Eriberto empalidece. Ele se aproxima com passos contidos, mas há algo prestes a explodir dentro dele.

ERIBERTO - (baixando o tom, a voz vacila por um segundo) Você não vai fazer isso. (mais forte) Ainda mais agora, depois da Sibeli

Alice olha para ele, surpresa. A menção à filha morta quebra uma parte do muro entre os dois.

ALICE - (sincera) Você amava mesmo aquela menina, né?

ERIBERTO - (com um nó na garganta, mas sem demonstrar fraqueza) Ela era minha filha.

ALICE - (irônica, com os olhos marejados) E esse aqui não é?

ERIBERTO - (olha fixo para ela) Talvez seja. E se for eu não quero perder outro.

Um silêncio terno agora. Tenso, íntimo.

Alice levanta-se. Ele a encara, mais próximo do que deveriam.

ALICE - (voz trêmula) Você quer esse filho por culpa ou por amor?

ERIBERTO - (sussurra, tenso) Eu quero você viva.
(pausa) E quero esse filho porque ele é um pedaço do que a gente é quando não tá fingindo.

Alice desaba. Ele a segura.

Beijam-se. Não há pressa. É um beijo denso, cheio de memórias e ressentimento, mas também de desejo e um afeto torto, mal resolvido.

Eles começam a se despir com pressa, mas sem urgência vulgar — como quem já se conhece, já se feriu demais, mas ainda assim se procura.

Eles fazem amor ali mesmo, no sofá de couro do escritório. A luz branca que entra pela janela envolve a cena como uma ironia do destino: tão pública quanto íntima.

DEPOIS
Alice, deitada sobre o peito dele, acaricia preguiçosamente sua barriga ainda invisível.
Eriberto fuma um charuto apagado. Um ritual.

ALICE - (com um sorriso debochado)Meu carioca...

ERIBERTO -(sem olhar para ela) Minha gauchona...

Eles se olham. Há ternura. Há medo. Há poder.

ERIBERTO - (com pesar) Isso não pode sair dessa sala. Não ainda.

ALICE - (clássica Braga) Relaxa. Política é igual orgasmo: quem faz direito, nunca conta. Quem conta demais é porque fingiu.

Ele ri. Ela sorri de lado, vencida mas altiva.

CORTA PARA:

 

CENA 2 – PALÁCIO GUANABARA. ESCRITÓRIO DE SELENA. INT. DIA

 

SONOPLASTIA AO FUNDO: SUTIL, TENSA, QUASE IMPERCEPTÍVEL. O SOM DE UM RELÓGIO ANTIGO MARCA OS SEGUNDOS.

CÂMERA PANORÂMICA LENTA pelo escritório refinado de SELENA, assessora-chefe e braço-direito de Stella. A luz entra filtrada pelas persianas. Tudo é calculadamente elegante. No canto, discretamente escondido atrás de livros de direito constitucional, está um sistema de escuta.

SOM DISTORCIDO vindo dos alto-falantes embutidos.

ERIBERTO - (em off, abafada)Pelo amor de Deus, Alice. Não faz isso. Eu preciso de tempo. A gente resolve isso junto. Mas não tira.”

SELENA, fria, sentada à mesa com um tablet, pausa tudo. Ela ergue os olhos lentamente. Respira fundo. Os dedos tamborilam a madeira da mesa.

A porta se abre abruptamente.

STELLA - (entrando nervosa) Selena, o que foi? Recebi sua mensagem. Que urgência é essa?

SELENA se levanta devagar. Caminha com calma até a vitrola. Toca a agulha. A música para. Silêncio. Ela olha para Stella com um leve brilho cínico nos olhos.

SELENA - (calma, firme) Ele engravidou a Alice.

STELLA empalidece instantaneamente. O impacto é imediato. Ela se apoia na cadeira de frente. Sua mão treme discretamente.

STELLA - (quase um sussurro, tentando controlar a voz) Tem certeza?

SELENA toca no botão do gravador. A VOZ DE ALICE preenche a sala.

ALICE - (voz baixa, frágil) Fiz o exame hoje. Estou grávida

STELLA fecha os olhos, engole em seco. Um silêncio pesado. A câmera foca em seu rosto devastado, mas sem lágrimas. Apenas cálculo.

STELLA - (baixa e seca) Isso não pode ir adiante. Isso precisa ser interrompido. Agora.

SELENA - (sem hesitar) Eu sei.

STELLA - (se aproximando, incisiva) Antes que ela saiba de qualquer coisa. Antes que ele desconfie. Entendeu?

SELENA - (fria como aço) Já estou cuidando disso.

CLOSE em Stella. Uma mulher ferida, humilhada, mas ainda no controle. Por pouco.

STELLA - (com o olhar fixo em algum ponto do passado) Eu jurei que essa menina não ia destruir minha vida. Nem que eu precise destruí-la primeiro.

CORTE BRUSCO.

CÂMERA SE MOVE LENTAMENTE para o gravador ainda ligado. A voz de Eriberto, agora em eco abafado:

ERIBERTO - (em off)
“A gente resolve isso junto...”

CORTA PARA:

 

CENA 3 – PALÁCIO DAS LARANJEIRAS. SUÍTE DE MARISA. INT. NOITE

 

SONOPLASTIA – “NE ME QUITTE PAS” – MAYSA

 

CÂMERA LENTA. Luz azulada da madrugada invade o quarto por entre as cortinas pesadas. O ambiente está mergulhado em penumbra. Objetos espalhados pelo chão: garrafas vazias de vinho, uma bandeja com linhas mal cortadas, uma seringa caída. A câmera passeia como se hesitasse em revelar a cena.

MARISA , em ruínas emocionais está largada sobre a cama, o lençol pela metade do corpo. Olhos semicerrados. Suada. O rímel escorrido denuncia o choro da noite anterior. Ela desperta aos poucos, sem pressa, como quem não deseja enfrentar o dia — ou a própria vida.

CLOSE no rosto de Marisa. Ela respira fundo. O som da respiração ofegante entra em contraponto à suavidade da música.

MARISA - (sussurrando para si mesma)Eu ainda tô aqui...

Ela se senta na cama. Tremores leves nos dedos. Pega o espelho de maquiagem na mesa de cabeceira, mas não para se maquiar. Ele revela sua própria imagem: destruída, inchada, os olhos vermelhos. Ela observa com desprezo. Treme.

CLOSE nas mãos. Ela prepara uma nova linha com gestos automáticos, viciados. Nada glamouroso. Tudo degradante.

MARISA - (murmurando): Só mais um pouco. Só mais hoje...

Cheira. Fecha os olhos. Silêncio.

CORTE PARA PLANO GERAL: Ela se deita de novo, a música ainda preenchendo o ar. Um filete de sangue escorre discretamente de uma das narinas.

A CÂMERA SE AFASTA LENTAMENTE. Mostra a suíte em sua decadência. O contraste entre o luxo do Palácio e a miséria pessoal de Marisa.

VOZ DE MARISA - (em off, quase inconsciente) Se eu sumir, será que alguém vai notar?

CORTA PARA:

 

CENA 4. APARTAMENTO DE CELESTE. BIBLIOTECA. INT. NOITE

 

SONOPLASTIA – "JE T’AIME… MOI NON PLUS" – SERGE GAINSBOURG E JANE BIRKIN.

 

CÂMERA LENTA.
A porta range suavemente ao ser empurrada. Evelyn entra na biblioteca com passos precisos, silenciosos. Ela veste luvas pretas de couro, a expressão fria, determinada. O ambiente é sofisticado, mas guarda um ar de decadência. Livros forram as paredes do chão ao teto. A iluminação é suave, quase sombria. Uma tempestade tímida começa lá fora — relâmpagos iluminam por breves instantes a cena.

CLOSE no rosto de Evelyn. Seus olhos percorrem as prateleiras com atenção milimétrica.

EVOLUIÇÃO DE CENA:
Evelyn começa a tirar livros com método — não aleatoriamente, mas como quem sabe exatamente o que procura. Retira três volumes da prateleira esquerda. Ouve um
 clique discreto. Sua expressão muda. Algo se move por trás dos livros — um pequeno compartimento se abre, revelando uma caixa preta com etiquetas manuais e antigas.

EVELYN (sussurrando para si, com um meio sorriso):
Sabia que você não resistiria a guardar tudo, Celeste...

Ela retira a caixa. Dentro, diversos VHS. As etiquetas, escritas com caneta preta, revelam nomes:

·       Bruno + S. – Quarto 12

·       S. – Confissão – 03/06

·       Eriberto – Reunião 04

EVELYN segura o primeiro VHS com as mãos trêmulas, tomada por antecipação. Ela observa um velho aparelho VHS sobre um móvel baixo, com uma pequena TV de tubo ainda conectada. Insere a fita.

O VÍDEO COMEÇA.

IMAGENS DATADAS, com filtro típico dos anos 2000, sem áudio.
Bruno e Stella surgem, claramente em um quarto de hotel. A filmagem é feita de ângulo alto, oculto — câmera espiã. Eles se beijam com urgência, despem-se. O desejo é brutal, incontrolável. Evelyn assiste de braços cruzados, impassível. Mas seus olhos brilham. Anota mentalmente cada detalhe.

CORTE PARA: OUTRO VHS sendo inserido.

Na nova filmagem, Stella, sentada em frente à mesma câmera, fala diretamente para a lente — como se estivesse fazendo um desabafo.

STELLA (NO VÍDEO, EM LÁGRIMAS):
Se algo acontecer comigo, eu quero que saibam a verdade. A filha que estou esperando não é do Eriberto. É do Bruno. Eu... eu não podia mais mentir.

EVELYN (sussurrando com frieza):
E agora, minha querida, não vai poder mais esconder nada.

Ela sorri. Lento. Perverso. Sabe que tem nas mãos a arma definitiva.

SONOPLASTIA volta com força no refrão da música, os gemidos da canção se misturando com a tensão dramática.


CORTA PARA:

 

CENA 5 – HOTEL. QUARTO DE PAULA E MÁRCIA. INT. NOITE

 

SONOPLASTIA – SOM SUTIL DE CHUVA CONTRA A JANELA.


A câmera passeia lentamente pelo quarto de hotel. Um espaço neutro, impessoal, elegante na medida certa — como se dissesse: “Você está aqui, mas não pertence a este lugar.”

MÁRCIA, de camisola de seda, cabelos soltos, está sentada à beira da cama. Há uma tensão visível no seu rosto. PAULA LEEE, ainda de tailleur amassado do dia, segura o notebook no colo, as luzes da tela refletindo em seus olhos. O quarto está em meia-luz. Ao fundo, o som do ar-condicionado contrasta com o tilintar ocasional de talheres no corredor.

PAULA - (olhando para a tela, em choque contido)
Meu Deus. Ele mandou tudo. Inclusive o nome.

MÁRCIA - (aproxima-se, inquieta) O nome de quem?

PAULA - (tensa) Do responsável por Sibeli na R2. Rodrigo Maldonado. Espanhol. Milionário. Dono de metade das start-ups de Madrid. E de um império digital com fachada de agência de talentos.

MÁRCIA - Rodrigo Maldonado?! (pausa) Ele já teve problemas com a polícia na Europa. Mas sempre escapou. Sempre teve alguém pra limpar a sujeira.

PAULA - (examina os documentos) Aqui tem e-mails. Ordens diretas. Relatórios médicos. Contratos de confidencialidade. Parece que Sibeli estava em um "programa privado de preparação para a fama". Nome bonito pra cárcere emocional.

MÁRCIA - (engolindo seco) E a mãe dela deixou?

PAULA - Com dinheiro suficiente. Algumas mães vendem os próprios fantasmas. E acham que ainda estão no lucro.

PAUSA. O silêncio pesa. Márcia caminha até o frigobar, pega uma mini garrafa de vodca, hesita, mas abre.

MÁRCIA - (com um riso amargo) Isso vai estourar. E quando estourar, não vai sobrar pedra sobre pedra. Nem do nome da R2, nem do Eriberto. Nem da gente.

PAULA - (olhando fixamente para os documentos) A verdade nunca explode sozinha. Ela espera a hora certa. E o escândalo certo.

CLOSE EM PAULA. Ela olha para a tela do notebook com a frieza de quem perdeu a inocência há anos. Ao fundo, Márcia bebe direto da garrafinha.

SONOPLASTIA CRESCE – O SOM DISTANTE DE UM AVIÃO, COMO UMA ESCAPADA IMPOSSÍVEL.

CORTA PARA:

 

CENA 6 – RESTAURANTE. BARCELONA. INT. NOITE

 

SONOPLASTIA – "JE T’AIME… MOI NON PLUS" – SERGE GAINSBOURG E JANE BIRKIN.

CÂMERA acompanha PAULA LEE, deslumbrante, com um vestido preto justo, decotado, mas elegante. O cabelo preso num coque frouxo, brincos de pérola. Ela caminha firme em direção a uma mesa no canto reservado do restaurante. Já está à espera MATEO, espanhol nos seus cinquenta e poucos anos, charmoso, um leve ar cínico, com a confiança de quem já comprou tudo que queria na vida.

MATEO - (levantando-se) Paula Lee. Jamais pensei que te veria de novo. Está ainda mais interessante.

PAULA - (sorrindo com malícia, sentando-se) E você continua com o mesmo perfume barato e o mesmo olhar de quem acredita que não tem nada a perder.

MATEO - (rindo baixo) Touché. Mas o que a diva de outrora quer de mim agora? Nostalgia?

PAULA - Memória. Preciso que você me lembre de certas coisas. Dos velhos tempos e da R2.

CLOSE no olhar de Mateo. Ele muda sutilmente de postura. A tensão cresce.

MATEO - R2? Pensava que esse nome tinha morrido com alguns fantasmas.

PAULA - Fantasma como o noivo de Sibeli?

PAUSA. Ele a observa, medindo o que pode ou deve dizer. O garçom traz vinho. Paula recusa. Mateo serve a si mesmo. Ela quer estar sóbria.

MATEO - Aquela história foi trágica demais até pra mim. Ele era um bom rapaz. Mas andava perguntando demais, confiando demais. E Sibeli estava sendo usada. Só não percebeu a tempo.

PAULA - (firme) Usada por quem?

MATEO - (baixando o tom) Rodrigo Maldonado. O príncipe dos salões e dos contratos escusos. Ele e Sibeli tinham um acordo. Não era amor. Era publicidade. Imagem. Mas ela quis sair. E quando quis, bom, você sabe como termina quando alguém quer sair.

PAULA - (gélida) Alguém sempre morre.

MATEO - Ou desaparece. Como Sibeli.

CLOSE em Paula. O rosto permanece calmo, mas os olhos ardem. Memórias, culpa, talvez raiva.

PAULA - Você vai me dizer onde encontro Rodrigo?

MATEO - (hesita) Não sou louco, Paula. Nem apaixonado. Como naquela noite em Ibiza.

PAULA - (se inclina, com um leve sorriso venenoso)
Mas você ainda é um homem. E eu ainda sou eu.

CLOSE-UP na mão dela sobre a dele. Ele sorri, rendido.

MATEO -(baixo) Ele está em Genebra. Vive entre suíços e segredos bancários.

PAULA -Perfeito. Os fantasmas adoram um bom cofre.

SONOPLASTIA — “Je T’Aime… Moi Non Plus”, em versão instrumental, retorna baixinho enquanto ela se levanta com elegância.

MATEO – Paula, cuidado. Maldonado não é como a gente. Ele é pior.

PAULA - (sem olhar pra trás) Eu também sou pior do que pareço.

CÂMERA acompanha Paula indo embora. Mateo fica para trás, olhando o copo de vinho como se estivesse vendo o passado inteiro girar.

CORTE SECO.

 

CENA 7 – CEMITÉRIO. EXT. DIA


SONOPLASTIA  AVE MARIA – JOANNA, EM VERSÃO INSTRUMENTAL DRAMÁTICA E LENTA.

 

O céu está nublado. Um vento leve percorre as lápides, fazendo as coroas de flores balançarem suavemente. Um pequeno grupo de pessoas se reúne em torno do túmulo recém-aberto. O padre finaliza a cerimônia com uma prece contida. Não há imprensa. Apenas a família e os íntimos.

PLANO GERAL – O caixão desce lentamente, enquanto a câmera percorre os rostos aflitos:
STELLA, de óculos escuros e véu preto, mantém-se fria, mas com as mãos trêmulas.
ERIBERTO, tenso, com olhar vago.
LAURINHA, controlada, mas com o maxilar travado.
ZILDA MARIA, profundamente comovida, segura um lenço.
ROBERTO e MARCELO, comovidos, mas atentos aos gestos uns dos outros.
SELENA, olhos marejados, observa Laurinha com cautela.
CONSUELO, ao fundo, murmura preces.

CLOSE EM MARISA, a irmã da falecida, em visível estado alterado. Seus olhos estão vermelhos, sua maquiagem borrada. Ela segura um copo plástico com algo que claramente não é só água. Tropeça, grita para o coveiro parar.

MARISA - (aos berros)Parem! Parem com isso! Eu não deixei! Eu não disse adeus! EU NÃO DISSE ADEUS!

Zilda tenta conter a moça, mas Marisa se desvencilha com violência.

MARISA - (aos prantos, descompensada): Ela era minha irmã! A ÚNICA pessoa que me amava de verdade! E agora ela se foi por culpa DE VOCÊS!(aponta para Laurinha e Eriberto)

O clima pesa. Todos se entreolham. Laurinha dá um passo para trás. Marisa cospe a verdade:

MARISA - (num grito que fere o silêncio)Os filhos da Laurinha são do Eriberto! 

CLOSE EM STELLA, impassível por fora, mas um leve tremor na boca denuncia o impacto.
CLOSE EM ERIBERTO, pálido.
CLOSE EM MARCELO, arregala os olhos.
CLOSE EM LAURINHA, em choque, busca uma reação que não vem.

SELENA - (baixinho, para si mesma)Filha da mãe...

ZILDA MARIA – (tenta abafar)Alguém tire ela daqui, por favor...

Mas Marisa continua:

MARISA - (rindo e chorando) A verdade é como cadáver! Por mais que tentem enterrar, sempre fede!

Ela tropeça, se ajoelha no chão de terra, e grita para o céu

MARISA  Desculpa, irmã, desculpa não ter te protegido...

A câmera se afasta lentamente, elevando-se, enquanto o grupo permanece estático. Um corte seco para a placa sendo colocada com o nome da falecida.

CORTA PARA:

 

CENA 8 – RUAS DE BARCELONA. EXT./INT. NOITE

SONOPLASTIA: “If It Makes You Happy” – Sheryl Crow (versão instrumental)

As ruas estreitas e históricas de Barcelona ganham uma aura misteriosa sob a luz dos postes e as sombras que dançam nas paredes antigas. Um carro preto elegante serpenteia com destreza por esse labirinto urbano iluminado.

No interior, PAULA LEE segura o celular firmemente, a voz baixa e urgente.

PAULA LEE - (pelo telefone) Evelyn, você tem que garantir que essas fitas sejam transferidas para DVD. Se algo acontecer comigo ou com a Márcia, elas são a única prova que temos. Guarda tudo num cofre, por segurança.

Do outro lado da linha, a voz de EVELYN é firme, mas carregada de tensão.

EVELYN - (voz pelo telefone) Pode deixar, Paula. Estou fazendo isso agora mesmo. Não vai dar problema.

Márcia, ao lado, vigia pela janela, olhos atentos. A atmosfera dentro do carro é tensa, uma mistura de medo e foco absoluto.

De repente, no reflexo da vitrine de uma loja, aparecem dois homens — encapuzados, implacáveis, se aproximando rápido.

MÁRCIA - (baixinho, para Paula) Temos companhia.

Paula troca o telefone de mão, olhos fixos à frente.

PAULA LEE - Vamos acelerar, não podemos deixar que nos peguem.

O carro ronca, a aceleração é feroz. As ruas de Barcelona viram palco de uma perseguição cinematográfica. Paula dirige como uma caçadora, cortando o trânsito com precisão brutal.

Ela vira em becos estreitos, sobe escadarias íngremes, e desafia o perigo em curvas de alta velocidade que quase tocam as paredes antigas da cidade.

Os perseguidores insistem, mas a experiência de Paula à direção e a astúcia de Márcia fazendo cálculos rápidos transformam a fuga em um balé de risco e sobrevivência.

Em determinado momento, Paula pisa forte no freio, muda de direção abruptamente, e os rivais, confusos, perdem o controle na calçada de pedras.

MÁRCIA - (sorriso meio nervoso) Eles perderam a rota.

Paula solta uma risada curta, seus olhos brilham na adrenalina.

PAULA LEE - Ainda não acabou. Vamos sumir antes que eles recuperem o fôlego.

Com uma última curva ousada, elas desaparecem entre as sombras do bairro gótico, deixando para trás o rugido distante do SUV que perdeu terreno.

PLANO DETALHE: Mãos firmes no volante, rostos decididos — a parceria delas é uma fortaleza.

CORTA PARA:

 

CENA 9 – DELEGACIA. INT. DIA

A luz fria e impessoal do escritório da delegada Yona atravessa as janelas altas, refletindo na mesa de madeira escura onde repousam arquivos, computadores e papéis amontoados. O murmúrio distante da delegacia permeia o ambiente, um som constante de passos apressados, telefones tocando e vozes abafadas.

Yona está em pé, firme, diante de sua equipe. O rosto sério, olhos penetrantes, transmite a urgência do momento. Com voz clara e determinada, ela fala:

YONA - (sem rodeios) O mandato para prisão da Márcia está suspenso. A perícia confirmou: o vídeo é deep fake. Temos sido manipulados — e muito bem manipulados.

Ela faz uma pausa, seu olhar varre a sala, buscando assegurar que todos entenderam a gravidade da situação.

YONA - (continuação) Agora, o trabalho começa de verdade. Quero toda a equipe focada em provas concretas, pistas reais. Esqueçam as distrações fabricadas, as falsas evidências. Nada de cair nas armadilhas das milícias. Estamos lidando com gente perigosa.

Um policial próximo a Yona mantém o telefone colado ao ouvido, seu rosto se contrai ao ouvir algo.

Com um movimento rápido, ele se afasta discretamente da sala, desaparecendo pelo corredor da delegacia.

No silêncio tenso, o telefone dele emite um sinal suave: a ligação está sendo feita.

Do outro lado da linha, uma voz fria e controlada atende.

POLICIAL INFILTRADO - (sussurrando)A Márcia está fora da mira, por enquanto. O plano deu errado.

O rosto do policial transmite uma mistura de alívio e preocupação, consciente de que a batalha está longe do fim.

A câmera retorna para Yona, que observa pela janela a movimentação da rua lá fora, consciente de que a justiça ainda precisa ser feita — e que o jogo de poder e mentiras só está começando.

CORTA PARA:

 

CENA 10 – SÃO PAULO. EXT. DIA

SONOPLASTIA - My Oh My (feat. Bebe Rexha & Tove Lo) - Kylie Minogue

A cidade pulsa sob o sol forte da tarde. Prédios de vidro refletem a luz, e as ruas fervilham com a pressa dos transeuntes. O som vibrante de My Oh My (feat. Bebe Rexha & Tove Lo) de Kylie Minogue cria uma atmosfera elétrica, cheia de expectativa.

Planos abertos revelam a Avenida Paulista fervilhando de vida — carros, bicicletas, vendedores ambulantes, pessoas apressadas em trajes variados que contam histórias diferentes. O MASP destaca-se imponente, enquanto os grafites e arte urbana dão cor aos becos mais escondidos.

A câmera transita suavemente em travellings e planos detalhes — a batida dos tênis no asfalto, mãos que seguram copos de café, sorrisos rápidos, olhares curiosos. Cada fragmento conta uma parte da cidade, um mosaico urbano que pulsa em ritmo frenético.

Em planos mais fechados, observa-se um envelope, discretamente deixado em um banco de praça, uma mala abandonada num canto, um telefone vibrando no bolso de um estranho. Pequenos mistérios surgem, ainda sem rosto, criando suspense.

O dia lentamente cede espaço para o crepúsculo, e as luzes da cidade começam a se acender, projetando sombras e iluminando segredos escondidos sob a superfície.

A trilha sonora cresce, mesclando o ritmo sensual da música com o som ambiente da cidade — buzinas, passos, vozes distantes.

A cena termina com a imagem da cidade vista do alto, iluminada e misteriosa, enquanto a música suavemente perde força, prometendo que as próximas histórias estão prestes a começar.

 

CENA 11 – PALÁCIO DOS BANDEIRANTES. ESCRITÓRIO DA GOVERNADORA. INT. DIA

O escritório é amplo, moderno, com grandes janelas que deixam entrar a luz do sol sobre uma vista panorâmica da cidade de São Paulo. O mobiliário é sóbrio, elegante, em tons escuros, refletindo o poder contido e a ambição da governadora.

AMANDA BONFIM, mulher de postura impecável e olhar frio, está sentada atrás da mesa de mogno. Seu semblante é calculista, a expressão firme, mas não sem traços de cansaço acumulado — a governadora sabe que o jogo que joga é perigoso.

No telefone, sua voz é firme, contida, com uma ponta de irritação contida.

AMANDA - (com tom autoritário) Não. Elas não saem desse jogo tão fácil. Marcia e Paula são mais espertas do que esperávamos.

Ela pausa, ouve do outro lado, franzindo levemente o cenho.

AMANDA - (mais fria ainda) Essa história não vai morrer enquanto elas estiverem vivas. E eu não vou permitir que nosso controle seja ameaçado por duas fugitivas.

A câmera fecha no rosto dela, destacando a tensão que se forma, o peso da responsabilidade, e a clara determinação.

Ela desliga o telefone com um clique seco, apoiando a testa nas mãos por um instante, antes de se recompor.

De repente, um silêncio pesado domina a sala, interrompido apenas pelo som distante dos carros e da cidade pulsando lá fora.

AMANDA - (para si mesma, quase um sussurro, mas cheio de desafio) Não é hora de recuar. É hora de jogar pesado.

A câmera recua lentamente, revelando a cidade vista por trás das janelas, um palco onde o poder, a traição e o destino se entrelaçam numa dança impiedosa.

CORTA PARA:

 

FIM

 

 

 

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