A OUTRA
CAPÍTULO 21
UMA NOVELA DE TAÍS GRIMALDI
CENA 1 – GENEBRA. RESTAURANTE LUXUOSO. INT. NOITE
SONOPLASTIA: TANGOSCURO – DEBAYRES
EXTERIOR – FACHADA DO RESTAURANTE
Uma noite fria, o vento desliza pelas pedras das calçadas bem cuidadas de Genebra. O letreiro discreto do restaurante pisca em neon vinho. Paula Lee (blazer Chanel, olhar cortante) e Rodrigo (terno escuro, charmoso, seguro) saem após o jantar.
PAULA LEE - (rindo baixo, acendendo um cigarro) Você tem talento pra fingir que o mundo é charmoso, Rodrigo. Mas há algo no seu olhar que diz que você prefere os bastidores da tragédia.
RODRIGO - (devolvendo o isqueiro) E você tem talento pra transformar tragédia em espetáculo. Isso é de família?
PAULA LEE - (acende, traga) É genética. E ressentimento. Misture os dois e você tem uma mulher perigosa.
Ambos riem. Há um flerte elegante, mas carregado de tensão. Paula observa o reflexo de dois homens no vidro do carro de luxo estacionado à frente.
PAULA LEE - (seca) Temos companhia.
RODRIGO - (olha discretamente) Corre.
CORTE SECO – AÇÃO RÁPIDA.
Os dois correm até o carro. Disparos ecoam. Vidros estilhaçados. Eles entram, Rodrigo assume o volante. Começa uma perseguição tensa pelas ruas estreitas de Genebra.
CÂMERA EM MOVIMENTO – ESTILO STREAMING DE AÇÃO MODERNA
O carro ziguezagueia, invade faixas, calçadas. Pedestres gritam. Paula orienta os atalhos com frieza.
PAULA LEE - Esquerda na próxima. Depois túnel. E se eu morrer, avise minha irmã que ela não vai herdar meu apartamento em Montmartre.
RODRIGO - (sarcástico, acelerando) Você acha que vai morrer? Você é feita de ferro e veneno.
PAULA LEE -Veneno é de Amanda. Eu sou o antídoto. Ou o gatilho.
Ela vê uma chance e, com precisão olímpica, salta do carro em movimento, caindo sobre um canteiro lateral. Os perseguidores não percebem. Continuam atrás de Rodrigo.
INTERIOR – CARRO DE RODRIGO
Rodrigo olha brevemente para o banco vazio ao lado, sorri com admiração.
RODRIGO - (em português) Filha da puta genial.
Segundos depois — impacto. O carro bate violentamente. Rodrigo tenta sair, cambaleante. Os homens se aproximam.
HOMEM 1 - (francês) Cadê a mulher?
HOMEM 2 - (francês) Ela pulou. Está viva. Estúpido.
Rodrigo olha para os dois. Sabe o que vem. Não suplica. Fecha os olhos.
DISPARO.
CORTE PARA – PLANO GERAL AÉREO
A noite sobre Genebra. As luzes da cidade contrastam com a escuridão da violência. Um corpo jaz no carro amassado.
CORTA PARA:
CENA 2. PALÁCIO GUANABARA. ESCRITÓRIO DE ALICE. INT. DIA
CÂMERA LENTA abre com YONA, impecável, terno escuro, pastas na mão, subindo as escadarias do palácio sob flashes de fotógrafos e repórteres do lado de fora. O clima é de cerco. Dois agentes federais discretos a acompanham.
CORTE PARA:
INTERIOR – ESCRITÓRIO DE ALICE
Ambiente sóbrio, decorado com livros raros, arte contemporânea e discretas imagens da campanha. A luz do dia entra por venezianas de madeira fechadas pela metade. Uma funcionária ao fundo organiza papéis, em silêncio tenso.
A porta se ABRE COM FORÇA. Yona entra com decisão.
YONA - (com voz seca, segura um mandado) Sou a Delegada Yona Magalhões. Estou aqui para cumprir um mandado de busca e apreensão. E, antes que alguém pense em dizer que não fui anunciada: isso foi intencional.
SELENA, a chefe de gabinete de Alice, levanta-se de sobressalto, pálida.
SELENA – Delegada, o que é isso? Isso é um absurdo! O governador não foi notificado!
YONA - Justamente por isso. Há um pedido de sigilo temporário. Fique à vontade para me acompanhar — ou tentar impedir e assinar seu atestado de obstrução de justiça.
SELENA - (engolindo seco) Eu acompanho.
Yona sinaliza para os agentes que começam a abrir gavetas, armários. Um deles entrega uma pequena caixa branca a Yona, com expressão intrigada.
AGENTE -Achamos isto na terceira gaveta, ao lado das chaves do cofre.
Yona segura o objeto pequeno, discreto, mas inequívoco: um teste de gravidez positivo.
Ela gira o objeto entre os dedos com elegância cirúrgica.
YONA - (olhando diretamente para Selena) A senhora sabia que Alice estava grávida?
SELENA - (trava um instante, depois, tentando parecer firme)
Não. Isso é um assunto pessoal. E nunca foi mencionado em nenhuma reunião.
YONA - (grave) Uma gravidez escondida em meio a uma investigação de tentativas de obstrução e uma campanha de eleição presidencial nas sombras. (pausa) É, no mínimo, interessante. No máximo trágico.
Selena evita o olhar de Yona, mas sua respiração está ofegante. A delegada se aproxima, falando baixo:
YONA - (off, com voz cortante) Quantos segredos cabem dentro de um útero, Selena?
A câmera se aproxima de Selena, o suor no rosto, os olhos perdidos. Yona caminha até a porta com o teste nas mãos como se carregasse um troféu.
YONA - (sem olhar para trás) Avisem o governador que hoje o país começará a desconfiar de quem ele realmente é.
Ela sai. Selena fica sozinha no escritório — o silêncio é brutal. O close final é no quadro que mostra Eriberto discursando, sorridente, em frente ao povo, com a legenda: "CORAGEM PARA MUDAR".
CORTE PARA:
CENA 3. PALÁCIO GUANABARA. HALL. INT. DIA
O hall do Palácio está em polvorosa. Policiais circulam com pastas, lanternas, olhares sérios. Há movimentação de repórteres sendo contidos por seguranças. O clima é de crise.
ERIBERTO, governador do estado, chega pelo elevador privativo, tenso, porém tentando manter o verniz da autoridade. Terno escuro, rosto cansado, mas ainda carismático.
A DELEGADA YONA MAGALHÃES, fria, precisa, está à sua espera. Sem se curvar ao poder.
YONA - Governador Eriberto. Agradeço por ter vindo tão rapidamente.
ERIBERTO - (nervoso, mas firme) Não vim. Eu trabalho aqui. O que está acontecendo no meu palácio, delegada?
YONA - Uma busca autorizada pelo juiz de instrução. A senhora Alice foi assassinada ontem à noite. Estamos investigando um homicídio.
Eriberto finge surpresa, mas a respiração se acelera levemente. Ele percebe a gravidade.
ERIBERTO - Alice está morta, delegada. Isso já não seria punição suficiente?
YONA - (séria, implacável) Talvez não para quem a matou. (Pausa. Ela o encara diretamente.) O senhor sabia da gravidez de Alice?
Eriberto hesita. Um instante. Curto. Mas visível.
ERIBERTO - (grave) Não. Nunca me disse nada.
YONA - Algum nome? Pai da criança?
ERIBERTO -Alice era reservada. Muito concentrada na campanha. Não tinha relacionamentos estáveis, que eu saiba.
YONA - (sem piscar) Então o senhor confirma que a senhora Alice, chefe de comunicação, engravidou durante a campanha enquanto trabalhava diretamente com o senhor?
Silêncio. Eriberto a encara, agora sem escudo. A tensão é densa.
ERIBERTO – Delegada, a senhora está insinuando algo?
YONA -Estou investigando fatos. O senhor prefere que eu os ignore?
Ele suspira. Olha ao redor. Repórteres, câmeras tentando espiar da entrada. Finge um sorriso político.
ERIBERTO - Lamento que o luto de todos tenha se transformado em espetáculo policial. (seco, irônico) Espero que esteja encontrando o que precisa.
Yona apenas o observa. Fria, impenetrável. Ele dá as costas e segue, com passos medidos, mas o desconforto é claro.
CORTA PARA:
CENA 4 – PALÁCIO DAS LARANJEIRAS. SALA DE JANTAR. INT. DIA
Luz filtrada pelas janelas altas. A mesa posta, impecável, como uma natureza morta: porcelanas, prataria, frutas cortadas em perfeição geométrica. CONSUELO toma seu café com parcimônia. Veste um robe de seda dourado, joias discretas. Ouve-se o tique-taque distante de um relógio. Silêncio. A paz da manhã rica.
De repente, a porta se escancara com estrondo. PAOLA, extravagante, intensa, corpo de diva decadente e espírito de furacão, entra sem pedir licença, com óculos escuros enormes, batom borrado e um vestido justo demais para o horário. A empregada grita ao fundo. CONSUELO paralisa, segurando a xícara no ar.
CONSUELO - (baixa a xícara com precisão cirúrgica) Ah, meu Deus. Preferia um ladrão.
PAOLA - (retira os óculos, encara a mãe com desdém) Pois é, mamãe. Não fui sequestrada por jihadistas, nem morta por um gigolô em Berlim. Tô viva. Graças a Deus, né?
CONSUELO - (seca, venenosa) Preferia você morta. Pelo menos me pouparia dessa caricatura.
PAOLA - (joga a bolsa no sofá, caminha pela sala como se fosse dela) Caricatura? Não sou eu quem vive encenando a dama vienense num país falido, mãe. E já que você é mãe do governador, eu decidi que vou me hospedar aqui. No palácio. Como uma condessa europeia perdida no trópico.
CONSUELO - (fria como gelo cortante) Você perdeu o juízo. Aqui você não fica. Nem morta dividimos o mesmo teto.
PAOLA - (vira-se lentamente, voz sibilante) Ah é? Quer que eu vá lá fora, faça um escândalo na calçada, e conte pra imprensa inteira que você (pausa dramática) inventou minha morte pra não ter que explicar que sua filha virou prostituta na Alemanha?
CONSUELO empalidece. O silêncio é mais alto que qualquer grito.
PAOLA - (avança, implacável) Ou quer que eu conte como foi que tudo começou? Lembra? Eu com dezessete. Naquela festa em Petrópolis. Aquele ministro bêbado que você deixou me levar pro quarto. Tudo por causa do Eriberto, né? Era o “preço” pelo apoio do partido. Você me jogou pros lobos, Consuelo.
CONSUELO levanta-se de repente. Pálida. Tremendo, mas sem perder a altivez.
CONSUELO -Cale a boca. Você não sabe o que diz. Está drogada.
PAOLA - (ri alto, histérica, teatral) Não, minha querida. Hoje não. Hoje eu tô sóbria, cheia de ódio, e com tempo.
PAOLA - (Ela se aproxima da mesa, pega um morango e morde com gosto.) Então, como vai ser? Me dá a suíte azul ou quer que eu vá até a sacada e grite: “Brasil, a filha da primeira-dama foi vendida como carne nova na Europa por causa de um cargo de governador”?
CONSUELO treme de fúria contida. Senta-se lentamente, recompondo-se.
CONSUELO - (seca) Você tem 48 horas. Depois disso, mando te remover com a polícia.
PAOLA -(sorriso debochado, senta-se à mesa como uma rainha decadente) Perfeito. Condessa que é condessa não se hospeda por mais de dois dias.
PAOLA -(Ela pega uma taça de cristal e brinda consigo mesma.) À família. Sempre unida nos escândalos.
CORTA PARA:
CENA 5 – RUA EM GENEBRA. EXT. NOITE.
Frio cortante. Paula caminha rápido por uma ruela de Genebra, tremendo mais de tensão que de frio. Ela segura o celular com força. Do outro lado da linha, está Márcia, em um flat em Ipanema, olhando o mar noturno. Ambas mulheres calejadas, inteligentes, perigosas.
PAULA - (em pânico contido) Eu pulei do carro, Márcia. Pulei antes da curva. Ele não conseguiu. Rodrigo (pausa) Rodrigo bateu. E os dois homens que vinham atrás eles o mataram. Frio. Profissional.
MÁRCIA - (silêncio tenso, depois calma) E você acha que foi acidente?
PAULA - (quase chora, mas não chora) Claro que não. Eles sabiam. Eles estavam esperando. Seguindo a gente desde a fronteira.
MÁRCIA - Você tá ferida?
PAULA - Só o joelho. Consegui correr até uma estalagem e me esconder. Mas não posso ficar aqui. Eles sabem que eu tô viva.
MÁRCIA - (sentando-se devagar, como se processasse um xeque-mate)E Amanda? Ela sabe?
PAULA - Minha irmã é a governadora do estado mais poderoso do país. Mas se acha acima de tudo, até das próprias emoções. Ela vai negar até o último segundo. Até a cabeça dela rolar.
MÁRCIA - (acende um cigarro) E a Stella?
PAULA - (um riso seco) A primeira-dama vai ser encurralada. Hoje. Por você.
MÁRCIA - (firme)Ela não tem mais como escapar. Os dossiês estão prontos. As imagens do hotel. A conta nas Ilhas Jersey. A fundação “Filhos do Futuro” é um esquema de lavagem. Eu só precisava da motivação. Agora tenho.
PAULA - (olha para o céu de Genebra, neve começando a cair) Rodrigo morreu por isso. Pra gente botar abaixo o império dos hipócritas.
MÁRCIA - (com raiva contida) E vamos derrubar um por um. Inclusive Amanda, se ela continuar fingindo que não vê o que tá debaixo do nariz dela.
PAULA - (baixa o tom)Ela sempre foi assim. Fingir. Mas eu nunca esqueci de suas farças.
MÁRCIA - (seca) E nem vai esquecer. Nem deve.
Silêncio pesado. Paula olha ao redor, desconfiada. Alguém passa por ela e ela se esconde na sombra.
PAULA - (baixo, tenso) Márcia, vou desligar. Eles tão aqui.
MÁRCIA - (grave) Você não vai morrer, Paula. Ainda tem muita coisa pra contar. E muita gente pra derrubar.
Paula desliga. Corre pela viela. A neve engrossa.
CORTE PARA:
MÁRCIA encara seu próprio reflexo no vidro da janela. Lembra de algo. Fecha os olhos. Acende outro cigarro. O celular ainda em sua mão pisca com a palavra: “INFORMAÇÕES CONFIDENCIAIS – STELLA”.
CORTE PARA:
CENA 6 – COBERTURA DE LAURINHA. SALA DE ESTAR. INT. DIA
A luz do sol invade com violência a cobertura ampla, decorada com um luxo tropical decadente. O bar de laca preta ainda ostenta taças pela metade. Almofadas no chão, vestígios da noite anterior. O silêncio é incômodo.
LAURINHA surge no alto da escada em um robe de seda estampado, descabelada, com um sorriso eufórico, quase infantil. Ela abre os braços.
LAURINHA - (entusiasmada) Bom dia, Rio de Janeiro! Pronta pra outra!
ZILDA MARIA, impecável como sempre, está sentada no sofá de linho bege, com um copo de água com limão e cara de poucos amigos. Observa Laurinha com frieza.
ZILDA MARIA - (pausa, seca) Você deveria estar de luto. Ou presa.
LAURINHA - (sorri, inocente) Eu tô viva, Zilda. E ele — aquele rato — não.
ZILDA MARIA -(severa) Você foi imprudente. Não era pra ter feito isso. A Alice não era o problema. O problema era quem mandava nela. E você sabe muito bem quem é.
LAURINHA - (encarando, oscilando entre raiva e dor) Selena me usou. Fez de mim uma idiota. Me prometeu proteção, lealdade. (ríspida) No fim, ela queria que eu fizesse o trabalho sujo. E ainda me olhasse como se fosse uma falha no sistema dela.
ZILDA MARIA - (pausa) Você devia ter deixado a Stella resolver isso. Era um acerto entre elas, desde sempre. A Alice não ia durar. Mas precisava cair da maneira certa. E não com sangue seu na parede do quarto de hóspedes.
LAURINHA - (voz embargada, mas firme) Eu não matei por elas. Eu matei por ele.
ZILDA MARIA -(irônica) Ah, sim. O grande amor da sua vida. Que só te procura de madrugada, quando ninguém vê. E te apaga como se você fosse um número antigo na agenda.
LAURINHA - (grita) Não fala dele! (pausa, se recompondo) Ele é a única coisa verdadeira que eu tive nos últimos anos. Eu protegi ele. Porque eu amo. E porque(engasga, quase chora) ele precisava de mim.
ZILDA MARIA - (cínica) E agora? Quem vai te proteger?
LAURINHA - (sorri, diabólica) Agora? Agora o jogo virou. A polícia pode vir, a imprensa pode latir. Mas eu sei de coisas que vão destruir essa república de fingimentos. (se aproxima) Se a Stella tentar me ferrar, eu afundo ela. Se a Selena se mover, eu explodo o palácio dela. (e com voz doce) E se ele me abandonar, eu conto tudo. Inclusive o que ele fez naquela noite no Guarujá.
ZILDA MARIA - (pausa, tensa) Você tá cavando o próprio túmulo.
LAURINHA -(sorri, felina) Pois que seja. Mas que seja num mausoléu de ouro. Porque eu posso morrer, mas vou morrer de salto alto, e com manchete.
A câmera se afasta lentamente. Laurinha caminha até a janela com vista para o mar. Acende um cigarro com elegância trágica. A fumaça sobe, carregada de segredos.
CORTE PARA:
CENA 7. TENNIS ROUTE – CENTRO DE TREINAMENTO DE TÊNIS. QUADRA PRINCIPAL. EXT. DIA
SOL A PINO. O barulho ritmado das raquetadas se mistura ao som abafado da cidade distante. Stu, jovem negro da periferia, foca nas bolas lançadas pela máquina. Seu corpo é firme, preciso, mas sua expressão carrega algo não resolvido.
ARTHUR, técnico experiente e branco, de quarenta e poucos, observa com atenção. Ele cruza os braços, caminha pela lateral da quadra, engolindo um silêncio que dura mais que deveria.
ARTHUR - (sério, sem rodeios) Stu, posso te fazer uma pergunta?
Stu para o saque. Enxuga o rosto com a toalha. Está suando mais que o normal — e não é só pelo calor.
STU - (seco) Se for sobre o treino, manda.
ARTHUR - (aproxima-se um passo, voz baixa) É sobre a Sibeli.
O corpo de Stu enrijece. A toalha para no meio do movimento. Ele encara Arthur por um segundo — os olhos endurecidos.
STU - (sem paciência) Você tá querendo saber o quê, exatamente?
ARTHUR - O que você tinha com ela. Porque desde que ela morreu, você tem ficado estranho. (pausa) Isso tem a ver com o caso dela?
Stu joga a toalha no banco. Caminha até a rede, como se precisasse de distância. A câmera o segue em um travelling lateral, lento.
STU - (cada palavra pesa) Cê não tem nada a ver com isso, Arthur.
ARTHUR -(sincero) Talvez não. Mas não sou cego. Sei quando um aluno tá carregando um peso que não devia. E sei reconhecer quando esse peso tem nome.
Stu respira fundo, as mãos no quadril. O sol reflete no suor das costas dele.
STU - A vida dela era dela. E a minha é minha. (duro) Não tenta juntar as duas.
ARTHUR - (suspeita no olhar) Você tá se protegendo de quê, Stu?
STU -(sai andando) Do tipo de gente que finge ajudar, mas no fundo só quer controlar.
Arthur assiste Stu se afastar. Fica sozinho no centro da quadra. O barulho das bolas continua — mecânico, impessoal. O mundo não para, mesmo quando as respostas não vêm.
CORTA PARA:
CENA 8 – PALÁCIO DAS LARANJEIRAS. SUÍTE DE STELLA E ERIBERTO. INT. DIA
O sol invade timidamente a suíte luxuosa, onde a luz natural contrasta com as sombras dos móveis clássicos e cortinas pesadas. O ar parece pesado, sufocante, como se carregasse todos os segredos não ditos da casa.
MÁRCIA, firme, mas com a voz trêmula pelo peso do momento, segura no punho um tablet. O vídeo está pausado na tela: Stella, nua, na cama com Bruno — um flagrante claro, uma prova que não permite contestação.
Stella entra, elegante, mas seu rosto perde a cor diante da imagem. O choque é imediato, quase visceral. Ela encara Marcia, olhos arregalados, a respiração curta.
STELLA - (voz trêmula, quase um sussurro) Como você conseguiu isso?
Marcia engole a saliva, segura, implacável.
MÁRCIA -Com isso, eu vou mostrar quem realmente é a assassina aqui.
Stella dá um passo à frente, as mãos tremendo, a máscara da compostura começando a desmoronar.
STELLA -(implorando, voz baixa, mas firme) Deixe essa história no passado. Aceite o que fez, não tente me destruir.
Marcia cruza os braços, uma sombra de um sorriso frio na face.
MÁRCIA -Você cometeu crimes demais, Stella. E eu estou aqui pra garantir que você pague por cada um deles.
Ela faz uma pausa, a tensão cresce no ar como uma tempestade prestes a explodir.
MÁRCIA - (sussurrando) Somos irmãs gêmeas, Stella. E eu sei tudo que você tentou esconder. Tudo que tentou matar.
Stella cai sentada numa poltrona, o olhar perdido, a face tomada por uma mistura amarga de medo e rancor.
O silêncio entre as duas é cortante. O jogo entre a verdade e a mentira, o amor e o ódio, está lançado. Uma batalha que vai muito além do que qualquer uma delas pode imaginar.
CORTA PARA:
CENA 9 – RUA RESIDENCIAL NO LEME. EXT. DIA
A rua calma do Leme está banhada por uma luz quase implacável do sol do meio-dia. Árvores balançam suavemente com a brisa morna do verão carioca. O som distante do mar mistura-se com o murmúrio da cidade.
Arthur segue Stu de longe, mantendo-se nas sombras, observando cada passo dele com um olhar de determinação e suspeita. Stu, com um andar ligeiro e desconfiado, para em frente a uma casa discreta, quase apagada entre outras residências.
Com o coração acelerado, Arthur mantém a distância enquanto vê Stu cruzar o portão e abraçar uma mulher – Mercedes. O abraço é tenso, cheio de histórias não ditas, mistura de rancor, medo e cumplicidade. Arthur, com a câmera do celular pronta, captura o momento com precisão cirúrgica.
Os olhos de Arthur brilham ao mandar as fotos para Paula Lee. A tensão é palpável, a sensação de que o jogo está ficando perigoso, cada movimento pode ser um passo para o abismo.
O silêncio da rua é cortado pelo som de um carro passando, mas o clima permanece denso, uma tempestade prestes a explodir.
CORTA PARA:
CENA 10 – AEROPORTO INTERNACIONAL DE GENEBRA. HALL. INT. NOITE
O hall do aeroporto é um cenário de luzes frias e movimentação constante, vozes em múltiplos idiomas ecoando pelas paredes modernas. O relógio marcando o ritmo acelerado dos destinos que se cruzam.
Paula Lee está parada junto à área de desembarque, com o olhar fixo no celular que vibra em sua mão. Ela abre as fotos enviadas por Arthur e seu rosto muda: o choque, a incredulidade e uma fúria contida se misturam em seus olhos.
As imagens mostram Mercedes, a mulher que ela julgava distante, agora revelada como a mãe do menino que matou seu sobrinho Vinícius. Um silêncio quase absoluto envolve Paula, como se o mundo tivesse parado para que ela pudesse absorver a traição.
Sua respiração se torna pesada, a mão tremendo levemente ao segurar o aparelho. As luzes do aeroporto parecem mais duras, implacáveis, iluminando as cicatrizes que essa revelação traz.
No fundo, um anúncio ecoa pelo sistema de som, mas Paula não ouve, sua mente já está em guerra.
A câmera fecha em seu rosto, que é um quadro perfeito de dor, raiva e determinação.
CORTA PARA:
CENA 11 – PALÁCIO DAS LARANJEIRAS. HALL DE ENTRADA. INT. DIA
O imponente hall de entrada do Palácio das Laranjeiras está tomado pela luz natural que escapa pelas grandes janelas, refletindo no mármore polido do chão. O silêncio é quase palpável, cortado apenas pelo som dos passos firmes de Marcia enquanto ela caminha em direção à saída.
Sua expressão é fria, carregada de determinação. O peso do que traz consigo parece carregar o ar ao redor.
De repente, uma voz ríspida quebra a atmosfera. Marisa surge de forma abrupta, olhos faiscando uma mistura de fúria e mágoa.
MARISA - (sem rodeios, com desprezo) Você não tem vergonha de aparecer aqui? Vem falar com a sua irmã como se fosse uma heroína?
Sem hesitar, Marisa dá um tapa seco no rosto de Marcia — um tapa que reverbera com a intensidade de um trovão silencioso no amplo salão.
Marcia não recua; pelo contrário, seu olhar se torna ainda mais afiado, a voz firme e carregada de acusação.
MARCIA - Vergonha? Não. Porque ao contrário de certas pessoas, eu não tenho sangue nas mãos. Não matei ninguém, ao contrário de Stella.
Marisa arqueia as sobrancelhas, um misto de choque e raiva, e avança com a dor que a consome.
MARISA - Você me privou de conviver com a minha avó, Celeste! Me roubou anos preciosos, anos que jamais vão voltar.
O ar fica denso, carregado de emoções contidas. Marcia retira da bolsa um pen drive, exibindo-o com um misto de desafio e esperança.
MARCIA - Olha isso. Um vídeo que prova tudo. Bruno e Stella, amantes. E Bruno pode ser seu pai. Vou expor a mentira que Stella sustentou durante todos esses anos.
O silêncio se instala, as palavras ecoando nas paredes como um aviso sombrio. O confronto entre as duas irmãs gêmeas se traduz numa batalha não apenas de palavras, mas de destinos.
A câmera se afasta lentamente, capturando o contraste entre a luz e as sombras que brincam nas paredes, espelhando a complexidade da trama que acaba de ser desencadeada.
CORTA PARA:
CENA 12 – PALÁCIO DAS LARANJEIRAS. SALA DE ESTAR. INT. DIA
A sala de estar do Palácio está imponente, revestida de painéis de madeira escura, com móveis clássicos e tapeçarias que parecem pesar séculos de história. A luz do dia entra filtrada pelas janelas altas, refletindo num chão de mármore lustroso que contrasta com o clima pesado no ar.
Paola e Eriberto estão frente a frente, os olhos faiscando em um duelo silencioso. Paola, altiva, usa um vestido de seda escuro que realça sua postura desafiante. Eriberto, rígido, tenta manter o controle, mas a tensão em seus ombros denuncia o turbilhão interno.
Stella observa ao fundo, seu rosto é uma máscara cuidadosamente esculpida — mistura de indiferença e cálculo. O silêncio pesa, antes que Marisa irrompa pela porta, olhos flamejantes.
MARISA - (voz cortante, sem dó) Cretina! Eu vi o vídeo. Você e Bruno juntos na cama. Me diz, ele é meu pai?
Eriberto congela. A palavra “vídeo” parece cortar o ar, e o choque se instala em seus olhos — não pelo escândalo em si, mas pela traição invisível que sempre recusou acreditar. Ele respira fundo, tentando controlar a tempestade que ameaça explodir.
ERIBERTO - (calmo, tentando manter o controle) Paola, Marisa, por favor, retirem-se.
As duas saem com olhares desafiadores, mas Eriberto sabe que a batalha acabou de começar.
Ele se volta para Stella, o semblante endurecido.
ERIBERTO - (voz áspera, firme) Vamos conversar, Stella. É hora da verdade.
Stella ergue a cabeça, seus olhos frios encaram Eriberto. Há um leve sorriso irônico.
STELLA - (com fingida inocência) Você sabe muito bem que sempre fui fiel a você. Foi apenas uma noite, um deslize que não significa nada. Eu te amo, Eriberto.
Eriberto balança a cabeça, o rosto distorcido pela raiva e desprezo.
ERIBERTO - (cortante, como punhal) Cachorra.
Com um golpe rápido e brutal, ele desfere um soco no ventre de Stella. Ela vacila, mas mantém a postura. Ele avança, encarando-a nos olhos.
ERIBERTO - (ameaçador) Marisa é filha do Bruno?
STELLA - (com desdém e firmeza) Não.
Sem aviso, Eriberto chuta o ventre dela com força, o impacto reverberando pela sala. Ele recua alguns passos, a respiração pesada, olhos brilhando de fúria contida.
ERIBERTO - (voz baixa, sombria) É pouco perto do que você merece. Mas é tudo que posso fazer agora.
O silêncio toma conta. Stella se recompõe lentamente, o olhar desafiante. A câmera se afasta lentamente, capturando o peso desse confronto que muda para sempre o destino de todos ali.
CORTA PARA:
CENA 13 – APARTAMENTO DE SELENA. QUARTO. INT. DIA
O apartamento de Selena reflete sua personalidade: luxo frio, minimalista, quase asséptico. A luz do dia entra com moderação, criando um jogo de luz e sombra que realça a frieza do lugar.
Evelyn chega decidida, sem disfarçar a hostilidade no olhar. Ela bate firme na porta, sem esperar resposta. A porta se abre lentamente, e Selena surge, com expressão gelada, os olhos faiscando de desprezo.
Entre elas, o ar vibra com a eletricidade do confronto. Não há cordialidade, apenas um desafio silencioso.
Selena cruza os braços, com um sorriso torto e venenoso.
SELĒNA - (voz carregada de sarcasmo) Veio me encher o saco de novo, Evelyn? Achei que tivesse desistido.
Evelyn avança, sem medo, encarando-a.
EVELYN - (frígida, cortante) Nunca desisto. Nem quando tenho que enfrentar quem for.
Enquanto as duas se encaram, Giuseppe está escondido atrás da porta do closet, o celular na mão, gravando cada palavra, cada olhar.
SELĒNA - (baixando o tom, ameaçadora) Cuidado com o que diz. Aqui, o jogo é outro. Você não sabe com quem está mexendo.
EVELYN - (sarcástica, com um sorriso de escárnio) Ah, eu sei exatamente com quem estou mexendo. E a verdade vai doer — especialmente para você.
Giuseppe, ainda oculto, aperta o botão de gravação com dedos trêmulos, ciente da importância daquele momento.
O silêncio se instala por um instante, tenso, prestes a explodir.
A câmera foca nos rostos das duas mulheres, mostrando a guerra silenciosa que se trava entre elas.
CORTA PARA:
FIM
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